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WhatsApp Image 2020 09 26 at 12.03.17Foto: CoppeUm projeto de 20 anos, e que pode colocar o Brasil em uma posição de destaque mundial em soluções para a mobilidade urbana, foi paralisado este mês por falta de investimentos. O MagLev-Cobra, trem de levitação magnética desenvolvido pelo Laboratório de Aplicações de Supercondutores da Coppe, não vai mais funcionar no campus do Fundão da UFRJ. A linha, que liga os blocos CT 1 e CT 2, foi inaugurada em 2015, e era parte do trabalho de desenvolvimento da tecnologia que pode mudar o transporte público.
Segundo o coordenador do projeto, professor Richard Stephan, o que deixa de funcionar é o veículo que opera na linha. “Aquele veículo foi feito de maneira artesanal. O próximo passo, se quisermos andar para frente, é sair desse veículo artesanal para um industrial”, contou o professor. Essa é a próxima etapa do projeto, a criação de um modelo que possa ser reproduzido em escala industrial. O valor necessário para essa etapa, segundo o professor, é de R$ 10 milhões.
“Estamos há cinco anos tentando dar esse passo e não conseguimos”, desabafou Richard. “Já pedimos ao BNDES e foi negado, à FINEP e foi negado, fizemos investidas com empresas e nenhuma foi avante”. Desde 2015, os pesquisadores vêm tentando captar os recursos necessários para iniciar a nova fase da pesquisa. A próxima etapa do planejamento é a sua conclusão. “Se conseguirmos os R$ 10 milhões que estamos pleiteando, colocaremos naquela mesma linha de teste um veículo industrial padrão, autônomo, um equipamento pronto para ser vendido”. A UFRJ oferece para empresas interessadas em investir na pesquisa, como contrapartida, uma parte da propriedade intelectual do MagLev-Cobra, com a garantia de que a universidade receba royalties sobre os lucros obtidos com a venda do produto.
Pronto, o MagLev-Cobra pode revolucionar o transporte urbano no Brasil. O modal não é um transporte de massa como o metrô, mas é mais barato. Na comparação com o VLT que opera no Rio de Janeiro, o Cobra tem os mesmos custos de implantação, de R$ 40 milhões por quilômetro, mas com vantagens que otimizam o transporte de passageiros, como as linhas segregadas, que permitem que o veículo se mova em uma velocidade média de 50 km/h, contra uma velocidade média de 15 km/h do VLT. O MagLev também é mais silencioso e consome menos energia. “Estamos trabalhando em uma alternativa que tem os mesmos custos de implantação, mas é melhor e tem uma tecnologia nova, nacional e realmente disruptiva”, disse Richard.
Atualmente apenas três países usam trens de levitação magnética: Coreia do Sul, China e Japão. O projeto desenvolvido pela UFRJ é inovador em relação à tecnologia que já é utilizada nestes países. “Nossa técnica de levitação é mais interessante. A diferença básica é que a nossa é estável, e a usada nesses outros MagLevs depende de sistemas de controle, de realimentação”, detalha o coordenador do projeto. “A tecnologia que desenvolvemos está sendo perseguida na Alemanha e na China, mas nós estamos na frente”.
A linha do MagLev-Cobra funcionava regularmente no Fundão desde 2016, e já transportou mais de 20 mil passageiros. A operação do veículo era uma atividade de extensão do curso de Engenharia Elétrica, e parou durante o período da pandemia. “Com a parada chegamos à reflexão que não fazia sentido o esforço de manter aquele veículo que volta e meia dá problemas porque não tem um padrão industrial”, explicou Stephan. “É um passo que deveríamos ter dado há mais tempo, mas faltou coragem”.
#SalvemOMagLev
A notícia do fim do transporte por trilhos levou um grupo de alunos da Engenharia Elétrica a criar nas redes sociais a campanha #SalvemOMagLev. A iniciativa começou depois que um post de um aluno do segundo período viralizou no Twitter, onde ele explicava a importância do projeto. A partir daí a ideia foi encampada pelo grupo de alunos que organiza a Semana da Engenharia Elétrica da UFRJ. “Resolvemos publicar a respeito do MagLev porque é uma situação muito séria que estamos enfrentando”, contou Guilherme Vaccariello, coordenador-geral do evento. “Não há uma divulgação muito boa da iniciativa. Vimos nas redes sociais informações falsas e descabidas sobre a tecnologia, para desqualificar o projeto”, explicou o estudante.
Além da divulgação, o grupo também está começando a entrar em contato com empresas que podem se interessar em investir na pesquisa. “É um produto que já está nas últimas fases, e tem um potencial muito grande”, defendeu Guilherme. “É frustrante ver um projeto que pode ajudar o Brasil a se tornar uma liderança em mobilidade urbana, parar por falta de recursos”, defendeu o estudante. Para o grupo, o MagLev-Cobra é importante para a universidade, e deve ser defendido. “É muito importante usarmos nossa visibilidade para ajudar o projeto”, disse.

WhatsApp Image 2020 09 21 at 14.20.16LIGA ACADÊMICA de Neurologia 2018: atividade prática - Foto: DivulgaçãoFormar-se em Medicina é um enorme desafio que começa já no vestibular, sempre bastante concorrido. Mas formar um médico é um trabalho igualmente desafiador, e pode ser ainda mais difícil para um curso tão recente quanto o de Medicina do campus de Macaé da UFRJ, criado há apenas 11 anos. Um quadro de professores deficitário e a falta de infraestrutura para as aulas práticas são os principais obstáculos.
“Faltam vagas e faltam candidatos, mas nosso maior problema é a falta de candidatos”, avaliou o professor Leonardo Cinelli, diretor em exercício do campus. “O salário na Academia para o médico não é atrativo”. A carreira médica tem uma média salarial alta, e isso diminui o interesse de possíveis postulantes às vagas oferecidas. Mas o professor acredita que uma decisão do Consuni pode melhorar o cenário: em dezembro do ano passado, o conselho publicou uma resolução liberando da dedicação exclusiva um terço dos professores que trabalham em regime de 40 horas na Medicina de Macaé. Antes, apenas os professores em regime de 20 horas semanais não tinham dedicação exclusiva.
“A dedicação exclusiva é uma condição que muitos médicos não querem, e às vezes o contrato de 20 horas não compensa para o profissional”, explicou Leonardo. “A quebra da DE é bem-vinda, acho que vamos conseguir mais e melhores candidatos com essa mudança”, falou.
A pró-reitoria de Pessoal (PR-4) está com um edital de concurso aberto que pretende contratar 10 docentes para a Medicina de Macaé. Segundo a coordenadora do curso, professora Laila Ertler, o concurso em andamento é para cobrir quase que exclusivamente cadeiras que estão sem nenhum professor.
As disciplinas de Propedêutica Médica, Clínica Médica e Pediatria estão entre as que mais sofrem as consequências da falta de docentes. Há 48 docentes efetivos exclusivos e mais 11 substitutos.
Na opinião da professora, um quadro de docentes pequeno restringe a experiência de aprendizagem dos alunos. “Temos poucas cadeiras com mais de um professor e algumas sem nenhum. Os alunos deveriam ter várias visões e estilos de ensino para se identificar e aprender”, disse.
O representante do Centro Acadêmico também atribui ao governo federal uma parte das dificuldades de contratação. “O problema de falta de professores é reflexo da desvalorização e desfinanciamento das universidades. Ficamos anos renovando vagas de professores substitutos e isso cronificou o problema. Além do fato de muitos profissionais médicos não verem atrativos na carreira docente, principalmente no interior”, disse Giovanni Vilela.
Enquanto isso, o curso segue movido pelo esforço dos docentes e técnicos. “Fazemos horas a mais de ensino e temos acúmulos de funções administrativas. Além disso, fizemos novas parcerias com um hospital privado local e outros setores públicos, contando com a solidariedade de profissionais da região”, contou a coordenadora. Laila é uma das professoras sobrecarregadas. “Dou aula em três disciplinas e coordeno a área de clínica médica do internato”, afirmou a docente, que também conduz atividades de pesquisa e extensão. “E existem outros professores em situações semelhantes”. Laila ainda acumula as funções administrativas da coordenação do curso. “Sozinha, esta atividade demanda as 20 horas de trabalho do meu vínculo”, relatou.
Outro problema é a falta de um hospital-escola. Na opinião do professor Leonardo Cinelli, um fator que também diminui o interesse dos candidatos à vaga de docência. “Os professores médicos querem um hospital-escola para ensinar”. As atividades práticas do curso, especialmente nos ciclos clínicos e no internato, acontecem em instalações da rede de saúde pública do município de Macaé, graças a um convênio da UFRJ com a prefeitura. “A prefeitura, independente de quem está no governo, sempre foi muito parceira da UFRJ. A relação é, de fato, muito saudável”, defendeu o professor. “Mas esse é um ponto em que ficamos muito frágeis, porque, se por qualquer motivo, o próximo prefeito, que vai ser eleito este ano, falar que não quer mais uma relação com a UFRJ, o convênio pode ser rompido de maneira unilateral. Essa é uma situação muito sensível.”
A coordenadora Laila Ertler reafirma a boa parceria com a prefeitura, e detalha os efeitos da falta do hospital para o curso. “A falta de um hospital universitário impacta na gestão e, consequentemente, no ensino. A falta de ingerência dificulta algumas entradas em determinados setores”, contou. A prefeitura oferece diversas unidades para as atividades práticas, como o Hospital Público Municipal e o Pronto Socorro Municipal, mas não são suficientes. “Os campos práticos têm capacidade reduzida para a nossa demanda. Um ambulatório, por exemplo, consegue receber, idealmente, apenas dois internos”, explicou Laila.
“Sobre hospital universitário, somos um curso que surgiu pensando na integração ensino-serviço, sendo a rede do SUS nosso campo prático. O importante são as pactuações e contratos entre universidade e município, garantindo campo prático e a universidade contribuindo pra comunidade de Macaé”, afirma o estudante Giovanni. O aluno entende que as dificuldades de infraestrutura não são exclusivas do curso: “Mas pra todos os cursos de campi do interior, que sofrem de forma ainda mais intensa os reflexos dos cortes de verbas”.
Todos os esforços até aqui entregam um ótimo resultado. Na sua primeira avaliação feita pelo MEC, o curso ficou com nota 4, a maior possível para um curso recém-criado. “O resultado é muito positivo. Nossos alunos saem e passam em concursos públicos, fazem excelentes residências pelo Brasil, alguns seguem a carreira acadêmica”, avalia o professor Leonardo. “Nossa nota no Enade é muito boa”, afirma o professor.
A coordenadora da Medicina concorda com a avaliação positiva, e ainda vê possibilidades de melhora. Para Laila Ertler, um dos caminhos é a Medicina de Macaé tornar-se uma referência entre as universidades do interior do estado, para atrair profissionais da área médica. “Temos muito a melhorar, mas temos bastante potencial para isso. Macaé é uma cidade aberta e acolhedora, e a gestão executiva do município está sempre à disposição para cooperar”, disse.

classroom 1910012 640Imagem de Wokandapix por PixabayA possibilidade de retorno das aulas presenciais nas escolas particulares do Rio de Janeiro ganhou os tribunais, desencadeou uma guerra de liminares e deixou crianças, famílias e profissionais de educação perdidos no centro de um tiroteio entre opiniões antagônicas. A sociedade de pediatria do Rio considera que é hora de debater a reabertura das escolas e alega que a longa quarentena gerou uma série de transtornos na saúde de meninas e meninos. Já pesquisadores e educadores da UFRJ compartilham da mesma posição do sindicato de professores: não é hora de voltar.
 “Nossa luta é contra o luto. É pela vida”, defende o professor Gustavo Henrique Cornélio,  diretor do Sinpro-Rio. O sindicato representa os professores da rede particular do município e moveu ação na justiça que resultou na proibição das aulas na cidade. “O dono quer a escola aberta para cobrar a mensalidade integral. É uma questão financeira, não de saúde”, argumenta Gustavo. “Queremos que o sindicato dos professores, o sindicato patronal e a sociedade discutam protocolos. Como serão feitos os testes para retorno das crianças? As escolas não estão querendo discutir isso”, critica.
No dia 14, a Fiocruz lançou um conjunto de indicadores necessários para a flexibilização do ensino remoto. Os pesquisadores recomendam que a reabertura das escolas deve estar baseada nos seguintes indicadores: transmissão comunitária menor que 1 caso novo por dia por cem mil habitantes; taxa de contágio menor que 1 por pelo menos 7 dias; 75% de leitos clínicos e de UTI livres; previsão de esgotamento de leitos de UTI superior a 57 dias; redução de 20% ou mais em número de óbitos e casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave, em relação a duas semanas anteriores; percentual inferior a 5% no número de testes positivos por amostras para Sars-Cov-2; capacidade para detectar, testar, isolar e monitorar pacientes/contactantes; que haja diagnóstico para pelo menos 80% dos casos no município ou território.
Apesar da estabilidade e da tendência de queda no número de mortes, o Rio de Janeiro ainda não alcançou os patamares recomendados pela Fiocruz. Segundo o Covidímetro da UFRJ, a taxa de transmissão da doença era de 1,12, na quarta-feira, 16. No mesmo dia, a Prefeitura do Rio divulgou números adicionais: 84% dos leitos de UTI na cidade ainda estão ocupados. Além disso, os leitos de enfermaria destinados ao tratamento da Covid-19 têm disponibilidade de 43%. Também não há testagem em massa, nem na cidade, nem no estado.

SOCIEDADE DE PEDIATRIA
Presidente da Sociedade de Pediatria do Rio de Janeiro (Soperj), a pediatra e epidemiologista Katia Nogueira considera importante debater a flexibilização, baseada em dados científicos. Ela ressalta que um desses dados fundamentais é a taxa de óbitos, que no Rio de Janeiro está com a média móvel caindo. “Sendo assim, acreditamos que este é o momento para falar em retorno. É preciso que se coloque as crianças no centro desse debate, elas foram esquecidas. O tema precisa ser tratado com prioridade”, afirma.
 “Há uma ameaça real à vida e um luto que muitas vezes não pode ser vivido, o que gera uma violenta pressão de adaptação a esta realidade. Temos muitas crianças com depressão e ansiedade geradas pela pandemia e pelo confinamento”, revela o psiquiatra Roberto Santoro Almeida, coordenador do GT de Saúde Mental da Sociedade Brasileira de Pediatria e chefe do serviço de Saúde Mental do Hospital Municipal Jesus.
Especialista em saúde mental de crianças e adolescentes, Almeida é favorável à ampliação do debate sobre a reabertura das escolas. E considera que o ponto fundamental não é a aula. “Não se pode fazer pressão acadêmica nos estudantes esse ano. Já há muitas pressões pelas quais estão passando. O ponto central do retorno à escola é o pequeno aumento da liberdade dentro de tantas restrições”, avalia. “Acompanho crianças que ficaram eufóricas esperando voltar à escola na segunda e foram terrivelmente frustradas quando souberam que não iriam mais. A escola faz falta”.
Ele considera que grande parte da instabilidade em torno do assunto se deva a uma polarização de opiniões não embasadas em análises multidisciplinares. “Crianças e adolescentes precisam de contato com seus pares para se desenvolverem. Essas medidas jurídicas geraram uma interferência muito grande na vida das pessoas. Virou uma guerra que traz como consequência ansiedade, frustração”, acredita o especialista. O psiquiatra sugere que pais devam estar em sintonia com as escolas e com os pediatras de seus filhos. “Os pais não devem estar em pânico. Se tiver dúvidas em relação a condutas, procure seu médico. O pediatra é quem conhece a criança e poderá melhor orientar diante de tantas incertezas”.
Para a Sociedade de Pediatria, sobretudo as crianças e adolescentes mais pobres correm mais riscos em casa do que na escola, mesmo que a pandemia ainda não tenha acabado. “Temos aumento da violência física, psicológica e sexual, desemprego e falta de acesso das famílias à renda e alimentação. Segundo a organização não governamental World Vision, houve aumento de até 37% de crianças e adolescentes entre 2 e 17 anos vítimas de todo tipo de violência nos primeiros meses de pandemia”, afirma Katia Nogueira, que é também professora de Pediatria da UERJ. “A escola vai além da formação pedagógica, ela reforça valores, funciona como proteção”, continua a professora Katia. “Já temos crianças menores que regrediram na fala. Há aumento na obesidade infantil. Atendemos casos de crianças que ganharam até 15kg em cinco meses”, elenca.

COMO APRENDER
E ENSINAR COM MEDO?
 “Abrir as escolas é uma atitude leviana e criminosa”, acusa a professora Daniela Patti, da Faculdade de Educação da UFRJ. “O estado do Rio de Janeiro tem mais de 3,5 milhões de crianças e jovens matriculados em escolas públicas e privadas. São mais pessoas do que a população de muitos estados brasileiros”, argumenta. “A reabertura implica em colocar os estudantes fluminenses, suas famílias, profissionais de educação e toda a comunidade em risco”.
“Como aprender e ensinar com medo? Como manejar e controlar as manifestações de afeto, as trocas de abraços, merendas, contatos físicos, entre crianças e jovens, sobretudo as menores?”, questiona. “Repudiamos a nota da Sociedade de Pediatria do Rio de Janeiro, ao afirmar que as escolas precisam ter coragem para uma imediata abertura e que devem ter uma liderança criativa e corajosa, com apoio dos pais e governo”, critica a professora.
Diretora do Colégio de Aplicação da UFRJ, a professora Maria de Fátima Galvão também discorda do retorno. “Enquanto não tivermos um consenso da comunidade científica sobre a segurança do retorno presencial, continuaremos em ensino remoto. A volta presencial não é prudente, embora entendamos todas as questões envolvidas na reabertura das escolas, como famílias que retornaram ao trabalho e não têm com quem deixar suas crianças, por exemplo, mas nós temos responsabilidade em preservar a vida”, argumenta.
A escola discute, no âmbito do GT Pós-Pandemia da universidade, que tem também um grupo correspondente no CAp, os protocolos que precisarão ser desenvolvidos e aplicados quando o retorno for indicado e seguro. “Mas, hoje, não vemos como fazer isso. Mesmo tomando todas as precauções, não há como garantir que crianças sigam protocolos de segurança e distanciamento. Como negar um abraço a um pequenininho que não nos vê há meses? Eles precisam de afeto, de contato no desenvolvimento. A escola, para eles, é socialização e esta função fica completamente comprometida com um distanciamento de dois metros”.
“Cabe o questionamento em relação à diferença de tempo de reabertura das escolas particulares para as escolas públicas”, complementa a professora Silvina Fernández, especialista em Prática de Administração Educacional e Planejamento e Avaliação dos Sistemas Educacionais, da Faculdade de Educação. “Seria de alguma forma uma preocupação pelo acesso à educação? Se assim for, por que quem paga terá acesso primeiro? Se for por uma questão sanitária, de as escolas privadas terem mais condições de garantir os protocolos, cabe questionar por que as escolas públicas não teriam essa capacidade garantida pelo próprio Estado”, aponta a docente.
Para a professora Carmen Gabriel, diretora do Complexo de Formação de Professores da UFRJ, a abertura neste momento também é precipitada. “Cada país está tratando este assunto de uma forma, mas, em todos, a pressão econômica é muito forte pela reabertura”, considera. Ela reconhece que muitas crianças perderam seu único espaço de socialização e, até mesmo, o espaço que lhes dava segurança. “Realmente a escola não é só espaço de produção de conhecimento, mas de sobrevivência para muitas crianças. É preciso tratar o assunto com um olhar multidisciplinar. Não pode ser uma questão meramente de opinião. No campo educacional, estamos discutindo profundamente este assunto, levando todos aspectos em consideração, mas, principalmente, a vida”, pondera.

GUERRA DE LIMINARES
A rede privada do estado está autorizada a voltar, mas, na cidade, uma decisão do Tribunal de Justiça, proferida em agosto – e reforçada na última terça-feira (15) –, impede a reabertura. A Procuradoria Geral do Município recorreu ao Supremo Tribunal Federal e aguarda decisão.
O Sindicato das Escolas Particulares foi procurado, mas não indicou um representante para falar com a reportagem até o fechamento da matéria.

WhatsApp Image 2020 09 21 at 14.13.49“A Educação não é uma pauta de um grupo nem mesmo de um governo. É uma pauta da sociedade brasileira, e que precisa ser desenvolvida”, disse Renato Janine Ribeiro, professor da USP e ex-ministro da pasta, no ato virtual “Orçamento Justo para a Educação” do dia 17.
Organizado pelo Observatório do Conhecimento, rede formada por diversas associações docentes — entre elas, a AdUFRJ —, além de mais 50 entidades representativas da Educação e da Ciência e 16 frentes parlamentares pluripartidárias, o evento apresentou um manifesto que cobra a imediata instalação da Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional para discutir os recursos de 2021. “A perspectiva de corte de R$ 1,882 bilhão no orçamento das chamadas despesas discricionárias para a educação, que envolvem o custeio e os investimentos, chama a atenção, sobretudo em um momento como o atual”, critica um trecho do documento.
O ato virtual atraiu parlamentares de diferentes espectros ideológicos. “Se a educação não for colocada como uma das prioridades, nós vamos lidar com isso para sempre. Nós temos centenas de obras paralisadas, incluindo creches e escolas”, lembrou a deputada federal Professora Dorinha Rezende, do Democratas.
“Qual é o projeto de país que nós queremos construir?”, indagou a deputada federal Tabata Amaral, do PDT. Relatora da comissão externa da Câmara criada para acompanhar o MEC, Tabata reforçou o absurdo dos cortes diante do desempenho das universidades federais no enfrentamento da pandemia. “Já são mais de 1.200 pesquisas sendo desenvolvidas, milhares de leitos disponibilizados, para dizer apenas alguns exemplos”.
Além de um orçamento justo para a educação, o manifesto das entidades defende a autonomia das universidades e dos institutos federais, com a nomeação dos reitores eleitos em processo democrático. Iago Montalvão, presidente da UNE, participou do evento logo após um ato presencial na UFRGS contra a recente intervenção do governo na reitoria (leia mais nas páginas 2 e 3). “Mais uma vez, foi desrespeitada a vontade da comunidade acadêmica de uma das maiores universidades federais do nosso país”, afirmou.
A presidente da AdUFRJ, professora Eleonora Ziller, participou do ato e valorizou a pluralidade de vozes em defesa da Educação. “Estamos aqui ouvindo, falando, insistindo, e consolidando uma unidade e um caminhar juntos, que no momento é o que temos de mais importante para construir”, disse.

WhatsApp Image 2020 09 21 at 14.02.591A taxa de mortalidade pela Covid-19 no município do Rio é a maior do mundo: 149,9 por 100 mil habitantes. Para se ter uma ideia do desastre carioca, a república de San Marino, na Europa, ocupa o segundo lugar do triste ranking com 124,3 mortes por 100 mil habitantes. E o Peru fica em terceiro: 93,71, de acordo com dados do dia 10. “É impressionante o que aconteceu aqui”, afirmou o coordenador do GT Coronavírus da UFRJ, professor Roberto Medronho, durante o Tamo Junto do dia 11. O encontro virtual organizado pela AdUFRJ todas as sextas-feiras teve uma edição especial para discutir a situação epidemiológica da doença.
O médico contou que, logo no início da pandemia, em março, conversou com as autoridades municipais e protocolou que a atenção básica precisaria ser fortalecida. “O prefeito Crivella destruiu a atenção básica. Essa é uma das hipóteses que apontam para nós sermos campeões de mortalidade do mundo”, destacou.
“Precisaríamos ter atenção básica atendendo os pacientes, isolando os casos positivos e identificando precocemente os casos que evoluíram para forma grave, internando imediatamente”, disse. “Isso reduziria muito a letalidade. Não foi o que aconteceu. O que vimos foi esse caos e essa corrupção impressionante no nosso estado e também no município”, declarou.
Medronho informou que o Hospital Universitário passou por uma fase muito crítica. “No HU, era um horror. O paciente morria sendo transportado para o CTI”, lembrou. “Pacientes que chegavam de maca, vivos. Quando estavam na porta da emergência, o doente estava morto já. Então foi um caos total”, afirmou.
 Apesar da atual diminuição dos casos de Covid no hospital, outros casos altamente complexos voltaram descompensados. “A enfermaria não Covid bombou com pacientes muito graves, porque não estavam procurando atendimento e houve uma descompensação do quadro clínico. Agora, estamos vivendo talvez o que seria o pior dos dois mundos”, declarou. Enquanto os doentes sem o vírus estão nas enfermarias e nas emergências, os doentes de Covid-19 começaram a reaparecer no HU.
Ainda no Rio, uma particularidade da pandemia intriga Medronho. “A gente achava que, quando chegasse às favelas, seria um caos. Não foi”, disse. Uma das hipóteses é a possível reação cruzada com quatro coronavírus mais antigos que costumam circular na sociedade. “Naquele ambiente, os quatro já estão ali direto e é possível que a reação (a eles) tenha ajudado”, avaliou.
 
MORTALIDADE X LETALIDADE
WhatsApp Image 2020 09 21 at 14.02.592O professor citou o filósofo e também docente da UFRJ Fernando Santoro para explicar a diferença entre letalidade e mortalidade. “Letalidade é sobre a gravidade da doença. Mortalidade diz sobre o risco de a população morrer daquela doença”, definiu. A letalidade é calculada em óbitos divididos por casos da doença. Já o índice de mortalidade é medido pelos óbitos divididos por toda a população.No total do Brasil, mesmo sem testar tanto, a taxa de letalidade não é muito alta.
 “A nossa é 3,1%, semelhante à dos Estados Unidos, que é 3,2%, e menor do que a Grã-Bretanha (12%) e Itália, com 11%”, esclareceu o professor. “No Sudão, está uma desgraça. Em guerra civil e com 28,9% de letalidade, ou seja, quase um terço dos pacientes de Covid vai a óbito”, lamentou.
Dentro do Brasil, a letalidade no Sudeste é a maior. E a do estado do Rio de Janeiro é maior ainda. Na evolução dos casos até o dia 5 de setembro, no estado fluminense, não houve uma segunda onda. “Nós tivemos o pico naquele final de abril, início de maio. Esse pico foi dramático, porque colapsou a rede hospitalar”, contou Medronho. “Os hospitais de campanha não foram contratados, houve a contratação de recém-formados muitas vezes sem nenhuma habilidade, e isso redundou numa elevada letalidade hospitalar”, lamentou o médico.
Outros estados, especialmente o Amazonas, também vivem uma situação dramática. “Quando a gente vê a incidência de casos sobre toda a população, o risco de adoecer, o Norte e o Centro-Oeste têm incidência maior”, afirmou.
Para Medronho, a elevada taxa de letalidade só não foi maior pela existência do Sistema Único de Saúde, o SUS. “Gratuito e aberto à população. Sem ele, teríamos um número de casos muito maior”, afirmou.
WhatsApp Image 2020 09 21 at 14.02.58Até a reunião do Tamo Junto, havia aproximadamente 28 milhões de casos de Covid-19 confirmados no mundo, mas o número é muito menor que o real em função da subnotificação, explicou o professor. “Vamos chegar rapidamente a um milhão de óbitos, que também está subenumerado”, afirmou — a Organização Mundial da Saúde informou 943 mil mortes pela pandemia, no dia 17.
Os Estados Unidos, o Brasil e a Argentina são os atuais epicentros da doença, mas a Índia aparece com números crescentes. “No nosso país, há uma tendência de queda de casos diários; nos Estados Unidos, também”, disse. “Na Índia, a coisa está explodindo e na Espanha já há uma segunda onda semelhante à primeira”, afirmou.
Na Europa, essa segunda onda está acontecendo em todos os países por conta do verão, no hemisfério norte. “A juventude que ficou confinada, com o verão está vivendo como se não houvesse amanhã, sem medo de ser feliz, aglomerando nas praias, nos ‘pubs’, nos restaurantes, nas festas”, explicou Medronho. “Bem parecido com os nossos jovens aqui e ainda nem chegamos ao verão”.

PANDEMIA
“A gente vai conviver com pandemias durante toda a nossa existência”, acredita Medronho. “São milhões de pessoas que cruzam as fronteiras no mundo inteiro. Isso, obviamente, é uma coisa fantástica, mas sem os devidos cuidados, sem a devida conscientização, nessa forma de exploração da natureza, do capitalismo selvagem e nessa acumulação absurda, é realmente insustentável”, explicou o médico. Em 2020, mesmo com a pandemia, o mundo teve quase cinco milhões de passageiros em tráfego aéreo. “Essa doença tem um perfil: mata preto e pobre. No Brasil, durante muitas semanas eram como quatro aviões caindo por dia e o pessoal na fila para viajar de avião nos aeroportos”, criticou.
Medronho mostrou um estudo que calcula a mobilização da população na rua a partir do uso de celulares. “Essa mobilização hoje está em torno de 60%. É igual à da pré-pandemia”, alertou.
Medronho afirmou que não há chance de vacinação em 2020. “Eu já botei meu calendário muito mais otimista em meados de junho do ano que vem”, contou. Ainda assim, as vacinas para a Covid-19 serão um recorde na Ciência. “Nunca tivemos tão rapidamente um processo de ensaio clínico de vacinas como esse. É recorde internacional”, disse. Antes dessa pandemia, a vacina produzida de forma mais rápida no mundo foi feita para tratar catapora. E demorou cinco anos, lembrou o professor. “Conviveremos com esse vírus, no mínimo, por dois anos. Mesmo quando a gente começar a vacinar, o acesso à vacina é demorado”, concluiu.

BATE-PAPO
Perguntas não faltaram para o convidado do Tamo Junto. O professor Nelson Braga, do Instituto de Física, questionou o médico sobre o isolamento social. “Vocês sempre defenderam essa questão do grande isolamento, talvez para baixar a curva por conta da capacidade hospitalar”, disse. “Agora você falou que o vírus dura dois anos. Ou seja, se a gente resolvesse aqui que todos os brasileiros vão ficar em casa cinco meses, o vírus não acabou?”, questionou. Medronho respondeu ao colega que não há evidência na história de que o isolamento debelou qualquer processo pandêmico de uma doença de transmissão respiratória. “A gente só está querendo que o vírus se dissemine mais lentamente, para os casos graves poderem ser absorvidos pelo sistema de saúde, e não morrer gente na fila da emergência”, afirmou.
 No caso do coronavírus, quanto maior o grau de confinamento, maior a probabilidade de que, quando se libere as pessoas, as que não estão infectadas encontrem com pessoas que estão, e isso gere uma segunda onda, como está ocorrendo na Europa. “Isso é um paradoxo também. Quanto mais eficaz (o isolamento), maior o número, se você tiver uma infecção depois”, afirmou o médico.
Cezar Augusto, professor da Faculdade de Farmácia e Chefe de Serviço da farmácia do Hospital Universitário, perguntou sobre o futuro dos medicamentos usados no tratamento da Covid-19. “Certamente produzimos muita coisa em tempo recorde nesses meses. Gostaria de saber se você vê algum fármaco ou algum candidato a fármaco com potencial de mudar alguma coisa no jogo, nos próximos meses ou até o próximo ano?”.
 Medronho contou que, numa revisão sistemática feita recentemente, foram analisados 3.262 mil artigos publicados na literatura médica sobre todos os tratamentos para a Covid-19. “Hidroxicloroquina, Renezivina, Conavir e Tonavir, corticoide, soroterapia, um monte de medicamentos e nenhum deles mostrou-se eficaz”, disse.
O professor citou relatos de casos fulminantes no Hospital Universitário pelo uso do medicamento Hidroxicloroquina. “A cloroquina pode trazer problemas graves de distúrbios da condução elétrica do coração, e o paciente morre”, contou.
“O vírus é uma coisa muito interessante. Alguns dizem que não é um ser vivo, outros dizem que é”, relatou. “É um material genético encoberto com glicoproteínas, isso que é um vírus. É tão simples que a gente não consegue entender”, afirmou.
 Medronho observou que pouquíssimas doenças virais conhecidas possuem tratamento concreto, objetivo e definitivo.
“Todas essas drogas testadas na fase pré-clínica, in vitro, foram absolutamente fantásticas. Quando vai para o ser humano, é outro departamento”, explicou. Isso se deve à complexidade do corpo humano e à relação do vírus com o hospedeiro. “A gente não sabe o que é que acontece”, afirmou. “Agora, teve caso de reinfecção e há casos que estamos vendo de reativação, quando o coronavírus, não sabemos bem o por quê, se esconde”, disse.  

HU SOLIDÁRIO
 “Eu chamei a Covid de doença da solidão”, contou o médico. “Quem entra para ser internado em qualquer hospital de Covid nunca mais vai ver a cara de ninguém, se morrer. Ninguém”, explicou. Mas uma iniciativa do Hospital Universitário minimizou esta situação.
A filha de Medronho, Renata, que está no último ano do curso de Medicina, participou de um projeto do HU para acompanhamento dos pacientes de Covid-19. “A Renata foi voluntária e trabalhou no CTI da Covid. Ela tomou conta de um funcionário do Instituto de Física, o Marçal”.
Professora do instituto, Thereza Paiva conhece o paciente. “Todo mundo sabe que a Renata acompanhou. Ela que mandava notícias para a gente do IF. Todo mundo superfeliz que ela estava lá e fez companhia para ele”, elogiou.
Medronho contou que Renata via como estava a evolução e ligava para a família para informar. “Ela ficou muito ligada à família do seu Marçal. No dia que ele teve alta, ela foi se despedir dele presencialmente e conhecer a filha e esposa”, lembrou. Para ele, esse projeto feito no Hospital Universitário não existe em nenhum lugar. “Esse cuidado de ligar todo dia, duas vezes por dia. Isso é UFRJ, é raro”, afirmou.

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