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WhatsApp Image 2022 07 18 at 00.13.28 1João Torres: "Ciência vive um cenário de pós-guerra de país vencido”“Nossa ciência está vivendo um cenário de pós-guerra de um país vencido”. A afirmação do presidente da AdUFRJ, professor João Torres, resume uma audiência na Assembleia Legislativa sobre o orçamento das universidades e institutos federais sediados no Rio, dia 11.
O professor citou o “orçamento do conhecimento”, estudo conduzido pelo Observatório do Conhecimento. De acordo com o levantamento, o sistema federal de universidades e de ciência e tecnologia do país perdeu quase R$ 100 bilhões, desde 2014. “A falta de financiamento tem um impacto direto sobre as condições de trabalho dos docentes”, explicou João aos parlamentares presentes. “Um exemplo claro é que, depois da pandemia, os prédios que ficaram mais de um ano praticamente sem uso se degradaram. E, sem verbas para manutenção, eles propiciam condições sanitárias inadequadas para os professores, alunos e técnicos”.
Estava todo mundo lá: UFRJ, UFF, UniRio, Rural, Instituto Federal Fluminense, IFRJ, Cefet e Pedro II. Diante dos sucessivos cortes nas receitas, gestores de todas as instituições compareceram à Alerj para apresentar um pedido de socorro coletivo. Em comum, existe a preocupação de assegurar o funcionamento até o final de ano, com garantia de assistência aos alunos mais vulneráveis e preservação dos empregos de funcionários terceirizados.
A situação é reflexo de uma queda brusca do financiamento das universidades. O orçamento discricionário — ou seja, a parte que exclui as despesas com pessoal — despencou à metade em apenas sete anos. “Desde 2016, o orçamento das universidades federais vem sofrendo expressivas perdas. Até 2019, eram perdas inflacionárias. A partir de 2020, além das perdas inflacionárias, o orçamento discricionário vem caindo, ano a ano, em valores nominais. Isso fez com que em 2022 o orçamento discricionário seja da ordem de 50% do que era em 2015”, disse o presidente da associação de reitores (Andifes), professor Marcus David, que participou do evento por videoconferência. O dirigente enfatizou que a perda repercute de forma significativa na economia de um estado como o Rio, que possui muitas instituições federais de ensino.
Entre elas, a maior e mais antiga universidade do país sofre uma crise do seu tamanho. “O nosso orçamento cai em termos reais e nominais e nossas despesas têm crescimento alto, que independem de nós”, disse o pró-reitor de Planejamento e Finanças da UFRJ, professor Eduardo Raupp. “É possível que tenhamos de tomar medidas drásticas de interromper semestre, decretar férias coletivas. É o único mecanismo pelo qual eu poderei reduzir abruptamente os contratos”.
Além dos prejuízos ao ensino, pesquisa e extensão, a decisão teria um efeito imediato na vida de milhares de pessoas: “Temos uma força de trabalho de quase três mil servidores terceirizados. São os primeiros a pagar esta conta, quando somos obrigados a suspender ou finalizar contratos. São os primeiros a perder seus empregos”. Os nove hospitais da UFRJ, embora contem com outras fontes de receita, também depende do orçamento da universidade.
O problema não se limita a 2022. O projeto de lei orçamentária para 2023 do governo Bolsonaro aponta um corte nas verbas das universidades. “Basicamente, nos deixa com o mesmo orçamento de quando estávamos com atividades remotas. Mas nosso custo de energia elétrica, que estava em R$ 2 milhões/mês, agora está em R$ 5 milhões/mês”, exemplificou.
Um a um, os demais gestores apresentaram a situação de cada instituiçao. Jefferson Manhães, reitor do Instituto Federal Fluminense (IFF), disse que seu orçamento caiu 31% desde 2015 (R$ 62,1 milhões para R$ 43,2 milhões) —sem considerar a inflação do período. No total, a rede de institutos federais sofreu ainda um cancelamento de R$ 183 milhões em 2022.
A falta de dinheiro também impede o cumprimento do Plano Nacional de Educação (PNE), previsto para encerrar em 2024, Natália Trindade, da APG UFRJ e da Associação Nacional dos Pós-graduandos, citou que a meta 14 do PNE — titular 60 mil mestres e 25 mil doutores por ano — não poderá ser mais alcançada em tão pouco tempo. “As pessoas estão desistindo da vida acadêmica. Defender o pós-graduando no orçamento é defender a ciência e tecnologia. O Brasil que a gente quer precisa alcançar estas metas”, disse.

AVALIAÇÃO DA ADUFRJ
Vice-presidente da AdUFRJ, a professora Mayra Goulart saudou a iniciativa da Alerj de reunir representantes de todas as instituições federais de educação do estado. A professora acredita que o evento — e sua possível reprodução nas demais assembleias legislativas e câmaras municipais do Brasil — cria uma pressão sobre deputados federais e senadores e pode ajudar a melhorar os números da Educação e da Ciência junto ao Congresso Nacional. “Quanto mais participação da sociedade civil, melhor”, disse.

GOVERNO “MASCARA” CORTE NA UFRJ PARA 2023

O governo modificou a previsão orçamentária da UFRJ para 2023: em vez do corte de 12,6%, anunciado na edição anterior do Jornal da AdUFRJ, o índice será de 2,53% (ou R$ 8,3 milhões). “Cai de R$ 329,2 milhões para 320,9 milhões. Mas esta queda está ‘mascarada’ por alguns movimentos feitos na proposta orçamentária do governo”, informou o pró-reitor de Finanças, professor Eduardo Raupp, durante o Consuni do dia 14.
A principal manobra do governo consistiu em cortar nas rubricas financiadas pelo Tesouro e, paralelamente, elevar o orçamento da receita própria da UFRJ — resultante basicamente de aluguéis de terrenos —, sem consultar a reitoria. “Ou seja, para que o impacto final fosse menor no global do orçamento, o governo está trocando fonte que vem dele por fonte que nós arrecadamos. Nós tínhamos uma previsão de aumento da arrecadação no ano que vem, mas o governo a colocou para cima, sem que houvesse qualquer tipo de ajuste conosco”,explicou Raupp. A perda na rubrica de funcionamento da universidade ficou em 14% (R$ 18,5 milhões). Já o aumento da receita própria chegou a 31% (R$ 14 milhões). Se as receitas próprias fossem excluídas da conta, o corte geral seria de 8%. Em uma avaliação preliminar, esta manobra já foi detectada em outras universidades, segundo o pró-reitor.
Nem o Museu Nacional foi poupado da tesourada. A rubrica de reconstrução da unidade cai para menos da metade (R$ 3,4 milhões para R$ 1,5 milhão). A proposta do governo preserva a verba de assistência estudantil, porém, sem reajuste. “É uma situação muito delicada, pois temos os riscos de carregar para o ano que vem os problemas de 2022”. O pró-reitor lembrou que a já insuficiente dotação orçamentária deste ano, de R$ 329 milhões, sofreu cortes. “Está em R$ 309 milhões, a mesma do ano passado, quando estávamos remotos”.

CONGRESSO NACIONAL REJEITA BLOQUEIO DO FNDCT

Em um único dia, duas vitórias para a ciência brasileira. Na terça-feira (12), o Congresso retirou de um projeto de lei o trecho que permitiria ao governo bloquear — e transferir para outras áreas — os recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Além disso, os parlamentares aprovaram na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2023 um aumento da parte do FNDCT para os chamados recursos não reembolsáveis, destinados a projetos de universidades e institutos de pesquisa.
Com o projeto de lei, o governo tentava formalizar o bloqueio de R$ 2,5 bilhões aplicado ao FNDCT em junho. Uma medida que já contrariava legislação aprovada pelo próprio Congresso no ano passado, a Lei Complementar 177, de acabar com a reserva de contingência e de impedir qualquer tipo de corte do fundo. Seguindo um destaque apresentado pela bancada do PT, os deputados rejeitaram o dispositivo (197 votos contra 187), que nem precisou ser votado no Senado. A decisão, segundo a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), não reverte automaticamente, mas torna ainda mais frágil o bloqueio operado pelo governo.
Em seguida, em uma sessão conjunta, os parlamentares aprovaram uma mudança na LDO que reduz de 50% para 15% o percentual de recursos do FNDCT que pode ser emprestado para empresas investirem em pesquisa. O dinheiro não é usado e acaba retornando, ao final do exercício fiscal, para os cofres do governo. Pela nova regra, 85% do fundo irão para os recursos não reembolsáveis. “Isso pode significar um aporte para o ano que vem da ordem de R$ 3 bilhões. Não é pouco. Pode fazer a diferença para muitas ações”, afirma o presidente de honra da SBPC e professor do Instituto de Física da UFRJ, Ildeu Moreira.
A nova divisão do FNDCT ainda pode ser vetada pelo presidente Jair Bolsonaro, que terá um prazo de 15 dias úteis a partir do recebimento do texto para a sanção. “Foi uma vitória importante da comunidade científica. Não está consolidada. Na LDO, o presidente pode vetar e vamos brigar no Congresso para manter”, disse Ildeu.

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