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WhatsApp Image 2021 06 12 at 09.06.13Um projeto de lei estadual reacendeu a discussão sobre a Casa da Ciência da UFRJ. No começo do mês, a deputada Dani Monteiro (PSOL) protocolou uma proposição para que a Casa seja tombada como patrimônio histórico e cultural do Rio de Janeiro. A proposta tem como justificativa a importância da instituição — o segundo centro cultural do país voltado para Ciências —, fundada em 1995. A importância histórica do prédio é que ele integra o complexo do antigo Hospital Nacional de Alienados, no campus da Praia Vermelha. O projeto da parlamentar vincula o prédio histórico com sua vocação científica e cultural.
“Aquela é uma área de interesse para especulação imobiliária”, disse a deputada Dani Monteiro. “A Casa da Ciência é um espaço de difusão do conhecimento há mais de 20 anos. Entendemos que é importante tombar a Casa, para afastar qualquer especulação imobiliária”.
A parlamentar justificou que o tombamento por meio de Lei Estadual pretende preservar a Casa no seu local, mesmo que haja mudanças na gestão da universidade. “É importante a Casa ser mantida ali. A ideia é que o tombamento a resguarde, inclusive, de qualquer mudança na gestão que possa haver dentro da UFRJ também. O tombamento pretende a manutenção daquele espaço”.

REITORA DISCORDA
Para a reitora Denise Pires de Carvalho, o projeto de lei é uma intervenção na autonomia da UFRJ. “É um ato que fere a autonomia frontalmente. É uma atitude que se assemelha à daqueles monarquistas que querem fazer do nosso Museu Nacional um museu imperial, sem passar pelos colegiados da UFRJ”, diz a reitora. Para Denise, trata-se da defesa da autonomia universitária como princípio. “É um precedente perigosíssimo. Porque hoje é por uma boa causa, mas amanhã um deputado estadual pode propor transformar nosso Museu Nacional em um museu imperial. Ou pior, como a recente proposta daquele deputado que quis fechar a Uerj”, explicou.
“Fico preocupada que parlamentares estejam ferindo frontalmente a autonomia universitária. A reitora e o vice-reitor não foram procurados pela parlamentar. Ninguém da administração da UFRJ foi procurado”, disse. Denise defendeu que as decisões sobre a Casa da Ciência sejam tomadas pela universidade em seus colegiados deliberativos. “A UFRJ nunca discutiu o fechamento da Casa da Ciência. E a interferência externa no ambiente da UFRJ é temerária. Não podemos admitir que parlamentares, de nenhum partido político, interfiram na nossa autonomia, na democracia interna e na institucionalidade”.
Denise ressaltou também que a UFRJ tem interesse em expandir as ações da Casa da Ciência para a Cidade Universitária, próxima aos complexos do Alemao e da Maré, locais de comunidades vulneráveis e que precisam muito do contato com a Ciência e a produção de conhecimento. “Conseguir fomento para expandir as atividades nesta área do Rio seria uma ótima proposta da deputada”.
A polêmica em torno da Casa da Ciência é alimentada pelo projeto Viva UFRJ, criado ainda na gestão do professor Roberto Leher à frente da reitoria e que prevê a parceria com BNDES para o aproveitamento econômico dos ativos imobiliários da instituição. “Nos comprometemos em dar continuidade à discussão do Viva UFRJ porque interrompê-la geraria um custo para a universidade”, explicou a reitora. Segundo ela, caso a universidade rescinda o contrato com o BNDES terá que arcar com uma multa de cerca de R$ 2,5 milhões. Uma consultoria foi contratada para fazer um estudo do potencial imobiliário da área da universidade. A pandemia atrasou a entrega, e só em fevereiro deste ano a UFRJ recebeu o relatório final. De acordo com a reitora, o documento está sendo resumido pela equipe responsável pelo projeto, e será apresentado aos colegiados da universidade.
“O projeto é muito grande, então está no contrato que ele pode ser subdividido. Se conseguirmos pagar o que devemos ao BNDES em um ou dois projetos, não precisamos seguir com outros. Essa decisão não é minha, é da universidade”, disse Denise, que fez questão de reforçar sua mensagem para o corpo social da instituição. “A comunidade acadêmica tem que ter tranquilidade. Minha gestão não venderá nada nem fará nenhum negócio com os terrenos da UFRJ sem que a comunidade conheça os detalhes, discuta e decida. Muito menos na Praia Vermelha, um lugar que tem uma atividade acadêmica intensa e que o vice-reitor e eu respeitamos muito”, declarou.
Entre os estudos apresentados preliminarmente pela comissão do Viva UFRJ, há a possibilidade de transferência da Casa da Ciência e sua reconstrução em local próximo, e outras modificações bastante significativas no campus da Praia Vermelha. Segundo a presidente da AdUFRJ, professora Eleonora Ziller, é isso que vem motivando a mobilização em torno do tema: “Apesar de serem estudos preliminares, precisam ser compreendidos e debatidos por toda a universidade. A pandemia acabou por deixar o assunto em banho-maria, mas já é hora de conhecermos a totalidade da proposta, e como será encaminhada, para que a comunidade se posicione, pois só assim poderemos dirimir dúvidas e acabar com sobressaltos”, defende Eleonora.
DISCUSSÃO TÉCNICA
O projeto de lei apresentado pela deputada Dani Monteiro se apoia em uma pesquisa feita pela historiadora Monica Cristina de Moraes, técnica da Casa da Ciência. Em sua tese de doutorado, ela resgatou a história do prédio. “Ele foi construído entre 1925 e 1926, e era parte do Hospital Nacional de Alienados. Ali ficavam as internas acometidas de tuberculoso, em isolamento”, explicou Monica. Quando ela começou a estudar a historiografia do edifício, havia poucos registros sobre o Pavilhão Alaor Prata. “À medida que fui investigando, levantando material e fontes, fui entendendo que a história era mais profunda”, contou. Segundo a sua pesquisa, o pavilhão foi uma melhoria construída no hospital, para que os pacientes ficassem em isolamento, prática que começou a ser adotada no final do século XIX para tratamento da tuberculose.
Mas para a professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ Andréa Borde, o projeto de lei não é suficiente para o tombamento da Casa da Ciência. “Tombamento é uma atribuição do poder Executivo”, explicou. Andréa ainda esclareceu que, caso o projeto seja aprovado na Alerj e sancionado pelo governador, ele não terá validade. Para ter validade, o tombamento precisa ser aprovado por um dos órgãos de tutela da área. No caso de uma proposta estadual, o pedido de tombamento deveria ter sido feito ao Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (Inepac). “Uma pessoa pode propor a um órgão de tutela uma pesquisa, o órgão vai encaminhar e vai propor o tombamento ou não”.
A Casa da Ciência segue funcionando, enfrentando ainda os desafios de ser um centro cultural no meio de uma pandemia. “Seguimos planejando nossas exposições e ações educativas. Assim que tivermos mais segurança, do ponto de vista da pandemia, esperamos reabrir nossas exposições”, contou Ismar Carvalho, diretor da Casa. “Estamos discutindo de que maneira vamos voltar, e de que maneira poderemos retornar, com segurança, o quanto antes. As exposições estão montadas e continuamos trabalhando”.

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