Programa fala pouco de universidades, mas integrantes da campanha já defenderam cobrança de mensalidades e oferta de vouchers a estudantes pobres. A autonomia universitária também está em xeque O programa de Jair Bolsonaro fala pouco de universidades, mas explicita a aposta na privatização e a crítica do que considera “doutrinação precoce” na educação. Integrantes da campanha já defenderam cobrança de mensalidades e oferta de vouchers a estudantes pobres. A autonomia universitária também está em xeque. O general que assessora o capitão na área educacional propôs mudar o critério de escolha de reitores. Bolsonaro afirmou que, na indicação do procurador-geral da República, não indicará nomes de esquerda. Se o candidato do PSL não respeita a votação dos membros do MPF, respeitará a forma como são escolhidos os dirigentes das federais? Por tudo isso, suas propostas inquietam a comunidade da UFRJ. AS PROPOSTAS DE BOLSONARO PARA AS UNIVERSIDADES Conteúdo curricular - Defende o Escola Sem Partido. Propõe mudar conteúdo e método de ensino, com “mais matemática, ciências e português, sem doutrinação e sexualização precoce”. Fala em “expurgar a ideologia de Paulo Freire” Em entrevistas recentes, o general Aléssio Souto, que cuida do programa de educação, defendeu o ensino do criacionismo e a eliminação de livros que não tragam a verdade sobre o golpe de 64. Formação e salário de docentes - Qualificação crescente dos professores. General assessor diz que pagar muito bem é uma absoluta impossibilidade agora. Universidades públicas e privadas contribuirão, num modelo integrado, na qualificação de alunos e professores. Educação à distância deve ser vista como um importante instrumento. Orçamento das Universidades - Propõe avançar em mais flexibilidade cambial e ortodoxia fiscal. Não cita emenda do Teto de Gasto. Diz que é possível fazer muito mais com os atuais recursos e que é preciso inverter a pirâmide de gastos, concentrando recursos na educação infantil, fundamental e média “Precisamos alterar (os gastos), mas não se faz facilmente, porque teria de mandar metade das pessoas embora, professores e funcionários.” Privatização - Programa aposta nas privatizações para reduzir a dívida pública. Sobre universidades, o economista Paulo Guedes afirmou: “Quem pode deve pagar. Se está na universidade pública, privada, deve pagar. E quem não pode pagar deve ter o ‘voucher educação’ sim. O ‘voucher educação’ para o jovem, ele tem que ter o direito de escolher. Pode escolher uma escola pública, entra e não é cobrado, ou pode escolher uma escola privada. Lá, entrega o “voucher educação”. “O pessoal carente poderia ter acesso através de vouchers fornecidos pelo governo”. Políticas afirmativas e cotas - Programa não trata do tema. Bolsonaro já disse que é contra cota raciais e a favor das sociais. General assessor defende prevalência do mérito e, em vez de cota, ensino complementar. “Nossa proposta é a prevalência do mérito. Mas como fazer? Eliminar agora? É preciso equilíbrio. Que tal ensino complementar aos desassistidos?” Ciência e Tecnologia - Programa afirma que modelo de pesquisa e desenvolvimento está esgotado. Propõe incentivar estratégias descentralizadas, com ‘hubs’ tecnológicos, para criar ambiente favorável a empreendedorismo, com participação das universidades. Tem defendido a redução do MEC, transferindo a responsabilidade para estados e municípios. Autonomia universitária - Não é abordada no programa. Em entrevista ao portal UOL, o general Aléssio criticou a forma de escolha de reitores O QUE OS PROFESSORES ANALISAM Sou e sempre fui contra mensalidades em universidades públicas, proposta por assessores do Bolsonaro. Quando dizem que há famílias que poderiam pagar, respondo que deveriam pagar mais imposto. Deveria ser feita a reforma tributária, que todo mundo fala, mas ninguém faz. Se dividir os gastos da UFRJ pelo número de alunos, e são milhares, seria uma fortuna para cada um. Não tem como. E o perfil do alunado mudou muito com as cotas. O sonho é um dia não precisar mais de cotas, mas está errado o discurso de Bolsonaro contrário às políticas afirmativas. Enquanto precisar, tem que fazer. A recriação do Ministério da Ciência e Tecnologia não é algo burocrático. A pós-graduação está ligada à Ciência e Tecnologia. A ampliação do investimento em Ciência e Tecnologia é pedido antigo da comunidade acadêmica. É correta a proposição do Haddad de aumentar as matrículas no ensino superior nas públicas, principalmente pelo interior. E dar condições às particulares, com Prouni e Fies.Para mim, nas duas campanhas, faltou um balanço mais qualitativo do que já foi feito nas universidades. NELSON MACULAN FILHO Ex-reitor e professor emérito da UFRJ, ex-secretário de Educação Superior do MEC Como em relação a outros temas, a campanha de Bolsonaro mente e distorce fatos sobre políticas educacionais. O principal exemplo é o chamado “kit gay”, nunca implantado. Em conjunto com a proposição de criticar a suposta “sexualização precoce” dos estudantes, Bolsonaro apoia a Escola Sem Partido, criticado por educadores de diferentes matizes, por representar retrocessos no desenho dos currículos e redução da autonomia dos professores, importante para garantir a qualidade da educação. Talvez a área da política educacional em que haja maior diferença entre os dois candidatos seja a educação superior. Haddad foi ministro e contabiliza entre seus feitos a expansão da rede federal de educação superior e de ensino técnico e profissional. Centenas de campi foram abertos em sua gestão. Políticas de ação afirmativa e assistência estudantil foram implementadas e o acesso à educação se abriu para milhões de jovens. Esta abertura promoveu diversificação do público das universidades federais no Brasil. Milhares de histórias de jovens que tiveram suas vidas transformadas por estas oportunidades. ROSANA HERINGER Vice-diretora da Faculdade de Educação
Em reunião realizada no dia 17, professores da UFRJ rejeitam candidato do PSL, apoiam Haddad e levam decisão para o Andes. Também aprovam a criação de uma frente antifascista Num sonoro não ao candidato que ameaça a democracia brasileira, professores da UFRJ decidiram recomendar ao Sindicato Nacional de Docentes o voto em Fernando Haddad (PT) e repudiar Jair Bolsonaro (PSL) na disputa presidencial. A decisão foi tomada na tarde de quarta-feira, 17, numa assembleia marcada por profunda preocupação com o destino do país e da universidade. “A neutralidade, hoje, é Bolsonaro. O muro é Bolsonaro”, afirmou a presidente da Adufrj, Maria Lúcia Werneck Vianna. Os docentes resolveram submeter o resultado da assembleia à reunião do Andes em Brasília, no dia 18, e montaram um calendário de mobilizações no Rio de Janeiro. Uma das atividades será a assembleia comunitária da UFRJ, na segunda-feira, dia 22, às 14h, no auditório do bloco A do Centro de Tecnologia. “Rejeitar a candidatura de Bolsonaro é insuficiente. É preciso afirmar voto no 13”, sinalizou Sara Granemann, representante dos docentes do Serviço Social. “Somos bastante críticos ao PT, mas o movimento é em defesa da democracia e contra o fascismo”, completou. Professores de diferentes grupos políticos apontaram, de forma unânime, a necessidade de se posicionar. “Há uma ameaça muito grave às universidades”, alertou o vice-presidente da Adufrj, Eduardo Raupp. Luciana Boiteux, do Direito, pediu unidade: “Estão em risco a democracia e a universidade pública. A UFRJ tem a responsabilidade de ser um polo organizador e de mobilização”. Para a universidade, o momento é decisivo. Há um abismo entre as propostas de Haddad e Bolsonaro para o ensino superior, como mostraremos ao longo deste Boletim. Se Bolsonaro tem um programa privatista e que fere a autonomia universitária, Haddad propõe o fortalecimento do ensino público e o respeito à autonomia universitária. Decisão do Andes A posição da UFRJ coincidiu com a da maioria das assembleias de professores das universidades brasileiras, mas foi derrotada na reunião do Andes por 13 votos a 9. Outras 11 assembleias votaram pelo sim a Haddad, mas como não havia representantes deles na reunião de Brasília, seus votos foram desconsiderados. Venceu a posição da diretoria do sindicato nacional, expressa no lema “contra o voto branco, contra o voto nulo e contra o fascismo”. Outras deliberações da assembleia A assembleia também aprovou: a criação de uma frente antifascista; o engajamento da Adufrj no ato das mulheres, sábado, dia 20; e no Dia Nacional de Lutas em Defesa do Serviço Público, em 24 de outubro. Uma comissão foi formada para elaborar materiais que dialoguem com a população sobre como as políticas das áreas econômica e social do candidato do PSL atacam especialmente os serviços públicos e os direitos dos mais pobres. “Precisamos dialogar dentro da universidade, mas também fora”, defendeu Maria Paula Araújo, diretora da Adufrj. AS PROPOSTAS DE HADDAD PARA AS UNIVERSIDADES Privatização e orçamento - O programa de governo propõe a valorização do ensino público e do serviço público. - Defende revogar a Emenda Constitucional 95, que instituiu o Teto de Gastos. Tem como proposta aumentar investimentos até alcançar a meta 20 do PNE (Plano Nacional de Educação), que prevê 10% do PIB para o setor. - Propõe fortalecer universidades e institutos federais com financiamento permanente. Conteúdo curricular - Como contraponto ao Escola Sem Partido, o programa de Haddad propõe Escola com Ciência e Cultura, para transformar as unidades educacionais em espaços de paz, reflexão, investigação científica e ação cultural. - Defende ações de educação para as relações étnico-raciais e as políticas afirmativas, com valorização da diversidade e dos direitos humanos, “a partir de uma perspectiva não-sexista, não-racista e não-LGBTIfóbica”. Ciência e Tecnologia - Propõe recriar o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação e ampliar os investimentos no setor. Formação de docentes - Propõe fortalecer o Pibid, voltado a estudantes de pedagogia e licenciatura; reforçar a Universidade Aberta do Brasil, além de retomar o projeto Universidade em Rede dos Professores, assegurando acesso dos concursados a vagas disponíveis na rede pública.
Buscar o centro é a saída óbvia da candidatura de Fernando Haddad (PT). Para o cientista político e professor da UFRJ Jairo Nicolau, o petista deve apostar na formação de uma frente política ampla, em defesa da democracia, que seja abraçada inclusive pelo eleitor que não é de esquerda, mas não quer um recuo autoritário. Em nome da democracia, deve buscar apoios de adversários históricos, como Fernando Henrique Cardoso, para construir uma aliança ampla, republicana. Nicolau destacou ainda que, no primeiro turno, Haddad não foi além do petismo clássico e não fez nenhuma sinalização ao eleitor de centro. Para o segundo turno, a estratégia teria que ser outra. “As pessoas estão cobrando uma nova Carta aos Brasileiros, mas ela tinha que ter sido feita ontem. Haddad não tem dado sinais a este eleitor”, afirmou Nicolau. Segundo ele, Haddad, mesmo quando parou de crescer, não mudou a estratégia. “Ele é menos petista que a campanha que ele fez”, afirmou. Professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas, da Fundação Getúlio Vargas (Ebape/ FGV), Otávio Amorim Neto também sinalizou o centro como saída, mas disse não ter certeza se haverá tempo para o sucesso da estratégia. Em sua avaliação, o antipetismo se tornou a maior força política do primeiro turno e Bolsonaro encarnou justamente o sentimento antipetista. O cientista político Ivo Coser, professor da UFRJ, prevê, da parte de Bolsonaro, um movimento para se redefinir, dizer que não é homofóbico nem contra direitos trabalhistas. Por outro lado, analisa Coser, Haddad vai ter que ser Haddad, indo além do lulismo e do petismo, que já lhe garantiram os 29% de votos válidos do primeiro turno. Para o docente, o petista tem que, sobre e para o futuro, dizer algo que não foi feito no governo Lula: “Ele tem que se desvencilhar da herança positiva do PT e do segundo governo e ir além”. O caminho é, assim, buscar o centro, onde está o eleitorado majoritário do país. “Ele tem que se encaminhar para o centro, indicar alianças ao centro. Vão dizer que é continuidade de tudo isso que está aí? Vão dizer. Mas o polo antissistema já está ocupado; é o Bolsonaro. O que resta ao Haddad é ir para o centro, buscar aval para uma política moderada”, analisa Coser.
Neste 15 de outubro, a presidente da Adufrj, Maria Lúcia Werneck Vianna, também comenta os desafios atuais do magistério na defesa da democracia e da universidade Neste 15 de outubro, Dia do Professor, a presidente da Adufrj, Maria Lúcia Werneck Vianna, parabeniza os docentes e comenta os desafios atuais do magistério: "Em nome da diretoria da Adufrj, quero dar os parabéns a todos os professores e professoras por este 15 de outubro. Nós temos, hoje, desafios bastante rigorosos, profundos, porque vivemos um momento particularmente importante e complexo da nossa história, que é este período pré-eleitoral. Período em que algumas ameaças, que já vinham se colocando em relação à UFRJ, têm se aprofundado. Por isso, eu conclamaria professores e professoras a resistirem. E, principalmente, a apostarem que somos capazes de vencer este momento. Temos instituições democráticas sólidas, profundas. Devemos apostar na institucionalidade democrática. Qualquer que seja o eleito, ele conviverá com o Congresso, com o Legislativo, com o Judiciário. Precisamos estar juntos, conscientes, apostando na democracia para fazermos do Brasil um país mais justo. A autonomia universitária é outro ponto que necessita de atenção. A própria manutenção da universidade pública, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada está em jogo. Este momento é complexo justamente porque ameaça a existência da universidade e a autonomia universitária. Nossa resistência, portanto, é no sentido de defender a universidade e apostar que a democracia vai resistir, vencer. E, com isso, a nossa universidade também será preservada."
Mais do que a eleição das redes, esta é a eleição do Whatsapp. A campanha de Haddad terá de intensificar a estratégia diante da máquina bolsonarista – cerca de 15 mil grupos de zap que começaram a agir há pelo menos três anos. Uma das tarefas decisivas do segundo turno, destaca a diretora da Escola de Comunicação da UFRJ, professora Ivana Bentes, é responder com máxima velocidade às fake news no zap. A docente, que participou de uma reunião de coletivos de mídia em São Paulo, destaca iniciativas que começam a ser montadas nas redes sociais. “Serão criados grupos de Whatsapp com links públicos para oferecer uma contranarrativa”, disse. “Começou uma campanha de cada um virar dois votos por dia. As pessoas têm que reaprender a conversar”. Ivana criticou a decisão da candidatura do PSL de não ir aos debates do segundo turno, mas vê coerência: “Quanto mais ele fala, mais explicita o vazio da argumentação. É lamentável”. Sem ir a debates, Bolsonaro reagenda o confronto público e o desloca para seu palco favorito, as redes, onde tem seguidores fiéis e não é contestado. Outro ponto importante, para a diretora da ECO, é simplificar a linguagem para dialogar com outros grupos sociais. “A esquerda se acostumou a trabalhar com análise de conjuntura, com um discurso que não fura a ‘bolha’. É preciso investir em memes, em humor”, afirma. O cientista político Antônio Lavareda acompanha grupos de whatsapp de um lado e outro. “O volume que recebo de material de Bolsonaro, em relação ao de Haddad, é de 10 para um”, afirma. Mesmo numa eleição tão polarizada, Lavareda entende que é possível “converter” votos e furar a bolha. Na verdade, afirma Lavareda, as bolhas vão se ampliando e há chance de argumentação. Para o professor de Publicidade e Propaganda da UFRJ Marcelo Serpa, é preciso ouvir: “É preciso se desarmar e entender o eleitor. Sem isso, não tem como tocá-lo”. O docente lista grupos a serem conquistados, e o maior deles é o que não foi votar: são quase 30 milhões de eleitores, o que gerou uma abstenção de 20,33%. “O público que não quer saber de política é mais fácil de conquistar”, afirma Serpa. Votos nulos somaram 7,2 milhões (6,14%), e os em branco, 3,1 milhões (2,65%) — e também são votos a serem conquistados. Outro grupo é o de eleitores de outros candidatos, como Ciro e Marina. Por fim, se houver tempo, é possível buscar eleitores de Bolsonaro. “Em uma ponta, temos o bolsonarista que faz campanha. Na outra, o confuso, que não sabe bem se posicionar, e opta pelo Bolsonaro. Eu faria pesquisa com bolsonaristas, tentaria entender seu grau de convencimento. E encontrar um discurso que seduza o bolsonarista que não é fechado”, afirma Serpa.