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O Observatório do Conhecimento é uma rede formada por 13 Associações e Sindicatos de docentes de universidades federais e estaduais de diversos estados brasileiros. A AdUFRJ é uma das fundadoras. O Observatório nasceu em março de 2019 com o objetivo de articular a defesa da universidade pública, gratuita e de qualidade e da liberdade acadêmica. É uma iniciativa suprapartidária e independente, para enfrentar os cortes de investimentos, além de monitorar e denunciar políticas de perseguição ideológica a reitores, professores, alunos e pesquisadores. Também é tarefa da organização produzir materiais e estudos sobre temas relacionados às políticas públicas de educação e C&T. Além da atuação política, as associações docentes participantes do Observatório do Conhecimento apoiam e realizam eventos nos campi e locais parceiros para engajar estudantes, professores e trabalhadores das universidades.

WEBMENORCHRISTINEChristine Ruta - Foto: Alessandro Costa/Arquivo AdufrjAté hoje apenas quatro cientistas receberam duas vezes o prêmio Nobel, a mais famosa premiação em ciência, entre eles uma mulher. Marie Skłodowska-Curie, ou como é mais conhecida Marie Curie, não somente foi a primeira pesquisadora nomeada para um Nobel, como também foi a primeira pessoa a receber dois prêmios e em duas disciplinas diferentes. Nascida em Varsóvia, a jovem Marie frequentou a secreta “Universidade Volante”, onde os cursos eram ministrados clandestinamente em resposta às proibições na Polônia daquela época. Marie em sua eterna busca pelo conhecimento, sempre sonhou em ter um diploma universitário. Diante dos obstáculos em acessar a universidade em seu país, uma única solução se apresentava para Marie: partir. Em 1883, ela diplomou-se em física, na Sorbonne, em Paris, e o final da história já é bem conhecido...
A história da Marie Curie só é conhecida porque antes houve o esforço para se construir a “Universidade Volante”. No Brasil, também já tivemos nossa era de universidades volantes e nossas Maries-Marias. Entre os anos de 2008 e 2018, observou-se um notório crescimento de 33,8% no número de matrículas em cursos de graduação da rede pública. Entretanto, o percentual de matrículas na rede privada é ainda maior, 75,4%, reflexo da presença majoritária de instituições particulares (88,2%) no nosso país.
A rede federal foi a única das categorias públicas que apresentou um aumento (89,7%) no número de matrículas nesse período, sendo o Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI) a principal política pública responsável por esse crescimento. Foi nesse contexto que surgiu o Instituto de Biodiversidade e Sustentabilidade e o Curso em Licenciatura em Ciências Biológicas. Foi a primeira experiência de interiorização da UFRJ, com uma identitade de pioneirismo e inovação.
Os primeiros docentes do Nupem chegaram entre os anos de 2006 e 2007, formando o grupo apelidado de “G13”: Alexandre de Azevedo, Ana Petry, André Morandini, Angélica Soares, José Nepomuceno, Lísia Gestinari, Mario Schultz, Tatiana Konno, Fabio Di Dario, Heitor Duarte, Laura Weber, Pablo Gonçalves, além de mim mesma, que hoje estou no Instituto de Biologia no Fundão, participo de outros projetos acadêmicos, mas levo o Nupem no Lattes e no coração como uma experiência formadora inesquecível.
Nossos laços do G13 tiveram como amálgama o acolhimento carinhoso do Prof. Francisco de Assis Esteves, o Chico, que foi o mentor deste importante passo na expansão, democratização e interiorização da nossa Universidade.
WEBMERIANEMERIANE DE PAULAestudante do Nupem é a primeira mestre de sua família. Bisneta de quilombolas de Quissamã, ela não precisou deixar sua cidade natal para realizar o sonho de cursar uma universidadeJuntos, esses docentes vivenciaram uma experiência indescritível que foi a implantação das bases do trinômio ensino-pesquisa-extensão em uma instituição fora da capital. E no caso, base tem um significado bastante literal: os docentes se reuniam em grupos de trabalho para planejar e desenhar as plantas do segundo pavilhão, que mais tarde abrigaria os novos laboratórios de pesquisas e salas de aulas. Também aprenderam nas atividades acadêmicas cotidianas a trabalhar seus saberes de forma integrada e interdisciplinar, sempre tendo como norteador a simbiose com a sociedade do Norte Fluminense.
Apesar do princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão que rege as universidades, na prática é muito difícil a integração acadêmica entre as diferentes áreas. As características do Nupem sempre foram naturalmente propícias ao surgimento de ações integradas. Um exemplo é a criação em 2009 da Semana de Integração Acadêmica em Macaé, que inspiraria a UFRJ a criar em 2010 a sua própria SIA. Outro exemplo notável é a atuação dos alunos da Pós em Ciências Ambientais e Conservação em ações de gestão e sustentabilidade inspiradas nos ambientes naturais que tiveram impacto na política regional.
Foi nesse habitat que surgiu uma de nossas Maries, a Meriane dos Santos de Paula. Filha de vigilante, neta de plantador de cana e bisneta de quilombolas de Quissamã, que se tornou orgulhosamente a primeira mestre da sua família simples e guerreira. Foi essa versão tropical goytacá de nossa “Universidade Volante” que abriu as portas para centenas de jovens realizarem o sonho semelhante ao de Marie Curie sem terem que “partir” de seu país. “O Nupem me deu a oportunidade de ter acesso a um conhecimento e formação que seriam inviáveis de serem custeados com recursos própios na capital”, resume a mestre Meriane.
Histórias como essas são comuns no Nupem, que teve seu início marcado pelas viagens de Kombi e os acampamentos do Chico e de seus alunos motivados em pesquisar os ecossistemas costeiros da região, como uma universidade volante goytacá, legal, mas igualmente precária, que se transformou e vem formando muitas maries brasileiras.

CHRISTINE RUTA

Professora da Biologia, uma das fundadoras do Nupem e diretora da AdUFRJ

O Jornal da Adufrj inaugura, nesta edição, uma seção para homenagear professores que foram grandes referências na universidade. Quem abre o espaço é a professora Samira Mesquita (1926-1994), da Faculdade de Letras, primeira decana do Centro de Letras e Artes.

 

WEBMENORSAMIRAHOMENAGEM: obra entre o CT e a reitoria foi inaugurada em outubro de 2010, na praça também batizada com o nome de Samira - Foto: Kelvin Melo“Samira é e não é. Nenhuma falta ela nos faz, porque está presente desde que se foi. É uma figura no espaço como um quadro que não está na parede”. Assim o ex-diretor da Faculdade de Letras, professor Edwaldo Cafezeiro, descreveu a colega Samira Nahid Mesquita, após seu falecimento. O discurso inspirou a obra a céu aberto localizada na Cidade Universitária para homenagear aquela que foi a primeira decana do Centro de Letras e Artes, entre 1985 e 1989.
Mas Samira foi bem mais que a pioneira na administração de um centro da UFRJ. Professora emérita, especialista em literatura brasileira, Cidadã da Poesia – título outorgado pela Associação de Cordelistas, em 1983 –, a docente reuniu admiradores por onde passou pela firmeza de suas posições, sempre apresentadas com serenidade, e a disposição em escutar o outro.
“Era muito democrática. Tinha um respeito enorme por todos. Se a moça que servia o cafezinho quisesse dar palpite, ela ouvia”, afirma Georgina Martins, que trabalhou com Samira na decania do CLA. Anna Maria de Castro, professora do IFCS, reforça o argumento: “Ela sempre foi uma pessoa de diálogo, de personalidade muito forte, mas fazia isso com toda gentileza”. Samira também foi fonte de inspiração para a presidente da AdUFRJ e professora da Faculdade de Letras, Eleonora Ziller: “Aprendi tanto com o exemplo político de Samira que dediquei meu discurso de posse para ela”.
Georgina observa que Samira publicou um livro (“O Enredo”, em 1986) usado até hoje para estudar narrativa. Mas destaca que ela “era de um tempo em que o professor estava mais interessado em dar aula do que publicar artigos”.
Talvez pela influência dos mestres que teve, como Manuel Bandeira, Alceu Amoroso Lima, Eduardo Portela ou Cleonice Berardinelli, fazia isso tão bem que se tornou paraninfa ou patrona de várias turmas ao longo da carreira (63, 66, 72, 73, 78, 83), informa outra técnica-administrativa que trabalhou com Samira na decania do CLA, Meri Cristina Toledo. “As aulas da Samira eram de fazer qualquer um babar. Ela sabia falar. Parecia que estava lendo. Conhecia o assunto e os autores”, confirma o professor Edwaldo Cafezeiro.
João Batista Vargens, professor do Setor de Estudos Árabes, teve experiência diferente: deu aulas para Samira por alguns períodos. Na condição de ouvinte, a filha de libaneses queria aperfeiçoar o domínio da escrita estrangeira. E João lembra algo que dizia à antiga aluna e colega: “Em árabe, a raiz da palavra ‘adab’ quer dizer pessoa educada e quer dizer também literatura. Ela conjugava bem os dois significados”.WEBSAMIRA TANOSSAMIRA com os docentes Carlos Tannus, Jorge Máximo e Alexandre Cardoso, em 1987 - Foto: acervo pessoal de Cristina Riche
Hoje ouvidora da UFRJ e também de ascendência libanesa, a professora Cristina Riche foi companheira de estudos de Samira nas aulas de árabe. E com ela criou uma intensa amizade. “Eu brincava que Samira era a Sherazade da literatura brasileira”. No clássico das Mil e uma Noites, Sherazade transforma o comportamento de um rei cruel, contando histórias cativantes. Para a ouvidora, Samira era semelhante por abraçar a literatura como instrumento de emancipação. “Ela aceitou participar da administração da universidade por entender que aquele era um espaço fundamental para promover a cultura, a literatura, a área de humanas, a área de letras e artes, interna e externamente à Universidade”, avalia Cristina.
Quando foi eleito vice-reitor de Horácio Macedo (naquela época, as eleições eram separadas) em 1986, o professor Alexandre Cardoso conheceu Samira no Conselho Universitário, onde os decanos são conselheiros. E se impressionou com o empenho da docente em levar a literatura para outros espaços da universidade, como o Centro de Tecnologia.
Cardoso acompanhou a luta de Samira contra o câncer que a vitimou: “Não se entregou. Foi uma batalha. Caía o cabelo, ela botava o lenço na cabeça e ia dar aula”. O docente recorda que, na inauguração do memorial do Fundão, após todos os discursos elogiosos para a homenageada, o filho de Samira, o cantor e ator Evandro Mesquita, tomou a palavra pra agradecer e disse, emocionado: “Imaginem tudo isso que vocês falaram dessa pessoa e eu poder chamá-la de mãe”.
Cristina Riche conclui que todas as homenagens para Samira são merecidas e necessárias: “Festejar Samira é festejar a vida. É festejar a universidade que produz um conhecimento libertador. Ela queria promover a integração dos saberes, e não deixar que ficassem em ‘caixinhas’. Ela sabia que isto envolvia certa utopia e, ao mesmo tempo, uma forma de resistência. Por isso, tinha tanto a dizer”.

WEBSAMIRA CRISTINALEDA DAU, Samira e Cristina Riche - Foto: acervo pessoal de Cristina Riche

WEBMENORCHICOProfessor Chico Esteves - Foto: Silvana SáPesquisador eminente em Ecologia e atual vice-diretor do Nupem, Francisco de Assis Esteves iniciou suas pesquisas em Macaé ainda em 1983. “Viajava dirigindo uma kombi azul com alunos, equipamentos de pesquisa e barracas. Eram 14 horas na estrada”, relembra o docente, dono do título de cidadão macaense. Além do Nupem, a UFRJ possui em Macaé o campus Aloísio Teixeira, onde ainda há uma série de lacunas de implantação, como relata Chico Esteves na entrevista a seguir:

O senhor é um entusiasta da interiorização.
Professor Chico Esteves: Quando a universidade pública vai para o interior, ela promove o desenvolvimento da região. Assim aconteceu com Piracicaba, Londrina, São Carlos. Se a gente conseguir organizar o que já temos em Macaé, a UFRJ pode servir de modelo para outras universidades. Precisamos transformar todo aquele investimento que a universidade já fez em desenvolvimento.

Enfrentou muita resistência?
Enfrentei e ainda enfrento. Mas conseguimos provar que é possível a universidade fazer interiorização com excelência no ensino, na pesquisa, na extensão. O NUPEM/UFRJ é nosso exemplo concreto. Ainda há quem acredite que a UFRJ é uma universidade somente da capital. Isto é um grande equívoco. Temos compromisso com a construção da nação brasileira.

O que diria para essas pessoas?
Para aqueles que ainda têm dúvidas, posso dizer que o motor que nos move é ver e ouvir o relato de muitos brasileiros que lá estudam, quando, com lágrimas nos olhos, dizem que não poderiam estar na universidade pública e de qualidade se a UFRJ não estivesse lá presente. Só isso já vale todo nosso esforço.

Qual a principal lição da interiorização da UFRJ?
De que valeu e está valendo a pena a busca por esta utopia. Hoje realizamos pesquisas de excelência com compromisso social para desenvolver a região e que impactam diretamente na vida das pessoas. Formamos excelentes quadros. Temos projetos de extensão com estudantes das escolas públicas, com professores da rede estadual. A universidade está atuante e plena na sua missão institucional de promover o bem estar dos cidadãos brasileiros que vivem em Macaé e região.

Por que o Nupem é tão exitoso e o campus Aloísio Teixeira passa por tantos problemas, como a falta de professores?
Houve dois problemas centrais: a gestão ficou aquém dos desafios que a implantação de um campus nos impõe. Haveria necessidade de termos um conjunto de professores da UFRJ experientes em interiorização. O outro problema é que a grandeza do projeto exige mais presença da administração central nos novos campi. Nossa missão inegociável é criar em Macaé uma universidade nos padrões acadêmicos, que é a tradição da UFRJ, e não uma universidade que funcione como um colégio.

Qual caminho seguir?
Não há segredo. É só seguir o modelo exitoso do NUPEM/UFRJ, ou o modelo USP/Ribeirão Preto, da Federal de São Carlos, da Unicamp, da Federal do ABC. Há muitos exemplos. Por que não seguir um destes?

WEBMENOROBSERVATORIO1Um “Pequeno Guia de Cotas Sociais e Raciais” foi organizado pelo Observatório do Conhecimento. A publicação explica o que é a lei de cotas, derruba mitos sobre o tema e faz um balanço de seu impacto. Dados da Andifes mostram que a partir de 2014, o percentual de estudantes negros nas universidades federais se aproxima do total de negros no país. Em 2003, apenas 34% dos estudantes eram negros. Em 2014, eles passaram a 47%. O país tem 54% de negros em sua população.

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