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capesNão há incoerência na gestão Bolsonaro. Ele despreza a ciência no discurso político e na prática orçamentária. No dia 18 de março, a Capes publicou portaria com cortes gigantescos no sistema nacional de pesquisa. Só a UFRJ perdeu 338 bolsas de pós-graduação. A redução surpreendeu a comunidade acadêmica de todo o país, foi rechaçada pelos 49 coordenadores de área da própria Capes e mobilizou a sociedade civil num momento em que a população mundial reconhece a pesquisa científica como a melhor arma contra a pandemia do corona.
A tesourada acertou tanto os programas mais consolidados e com elevadas performances quanto os que se esforçam para melhorar seus indicadores. A UFRJ ficou sem 242 bolsas do programa de demanda Social e 96 do Proex - voltado para os Programas de Excelência.
“O conjunto dos 11 cursos da UFRJ que mais perderam bolsas é formado exclusivamente por cursos com notas 5, 6 e 7 e totalizam uma perda de 118 bolsas”, lamenta a pró-reitora de pesquisa, professora Denise Freire, resumindo em seguida o impacto da mudança. “No caso do Programa de Química, por exemplo, impedirá o ingresso de novos bolsistas no curso de mestrado e doutorado”.
A Química, curso com nota 6 na Capes, perdeu 15 bolsas de doutorado e 12 de mestrado. Na Ecologia, a redução foi de 13. E na História social de 10, segundo o levantamento realizado por Denise Freire e pelo superintendente acadêmico de pós-graduação, professor José Luís Lopes da Silveira.
Após o dimensionamento do impacto nos programas de pesquisa, a pró-reitora encaminhou uma carta indignada ao presidente da Capes, Benedito Aguiar, empossado em janeiro deste ano. “Permita-me dizer que foi com grande surpresa que essa Pró-reitoria tomou conhecimento da publicação da Portaria nº 34, de 18 de março de 2020, que alterou a distribuição dos pisos e tetos para a concessão de bolsas aos Programas de Pós-graduação”, escreveu Denise Freire.
O anúncio da Capes ocorreu quando os cursos já haviam concluído o processo seletivo para o ano de 2020 e selecionado os seus candidatos à bolsa, o que gerou indignação entre os pós-graduandos de todo o país.  “A medida prolongará o clima de pânico e desesperança que já existe entre os pós-graduandos e todos que integram o sistema nacional de pós-graduação brasileiro”, lamentou, em nota, a Associação Nacional de Pós-Graduandos
Para reduzir essa desesperança, a pró-reitoria de pesquisa da UFRJ sinalizou que só há um caminho – revogar a portaria que reduziu as bolsas. “A nova portaria criou um conjunto de dificuldades para as quais uma solução razoável e possível é a sua alteração ou revogação, como forma de reduzir os impactos negativos para os diversos Programas de Pós-graduação”

Leia abaixo, a integra da carta.

CARTA DA PR-2

Denise Maria Guimarães Freire
Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Universidade Federal do Rio de Janeiro

Inicialmente, gostaria de cumprimentá-lo respeitosamente e parabenizá-lo pela nomeação ao honroso cargo de Presidente da CAPES, instituição tão cara a todos nós que atuamos na formação de recursos humanos para a pesquisa e para o ensino superior. Como Pró-reitora de Pós-graduação e Pesquisa da UFRJ, acredito que comungamos do mesmo sentimento de que a CAPES é uma instituição valiosa e com importância inquestionável para o desenvolvimento dos recursos humanos, que o país tanto necessita, para enfrentar os desafios do presente e do futuro.
Permita-me dizer que foi com grande surpresa que essa Pró-reitoria tomou conhecimento da publicação da Portaria no 34, de 18 de março de 2020, que alterou a distribuição dos pisos e tetos para a concessão de bolsas aos Programas de Pós-graduação, definidos pelas Portarias no 20 e no 21, de fevereiro de 2020.
Infelizmente, tal medida, anunciada em 18 de março de 2020, menos de um mês após a divulgação da concessão das cotas de bolsas aos Programas de Pós-graduação, em 3 de março de 2020, alterou substancialmente o espírito das Portarias 20 e 21, especificamente no que tange ao limite de perdas no número de bolsas.
As referidas portarias, que foram construídas por meio do debate com o Fórum Nacional de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação (FOPROP), previam que as perdas não poderiam ser superiores a 10%, o que permitiria uma adaptação mais adequada e equilibrada a nova política de distribuição de bolsas.
A Portaria 34, no entanto, ampliou de modo bastante drástico os pisos e tetos para a distribuição das bolsas, o que resultou em um aumento substancial da cota empréstimo na concessão de bolsas aos Programas, anunciada em 18 de março de 2020. Essa ampliação, resultou em um impacto extremamente negativo para alguns Programas bem avaliados, incluindo cursos de excelência, com notas 6 e 7.
A cota empréstimo, tal como decorre da aplicação das Portarias 20 e 21, posteriormente alterada pela Portaria 34, impõe uma perda progressiva na cota total de bolsas dos Programas de Pós- graduação. Materializando-se em um corte do número de bolsas que ocorre a curto, médio e longo prazo. Na UFRJ, as perdas chegarão a um total de 338 bolsas, das quais 242 bolsas de Programas atendidos pelo Programa de Demanda Social e 96 bolsas de Programas de Pós-graduação contemplados pelo PROEX, que é voltado para os Programas de Excelência. Esses números ultrapassam amplamente o limite de 10% inicialmente proposto pelas Portarias 20 e 21 e alcançam 20,8% para os Programas da Demanda Social.
A título de exemplo, o conjunto dos 11 cursos da UFRJ que mais perderam bolsas é formado exclusivamente por cursos com notas 5, 6 e 7 e totalizam uma perda de 118 bolsas, ao passo que com base nos critérios das Portarias 20 e 21 esses mesmos cursos sofreriam uma perda muito menor, de 36 bolsas. Ainda que soe estranho penalizar cursos com boa avaliação, compreende-se que a atual gestão da CAPES e do Ministério da Educação desejem implantar uma política para alocação de bolsas que considere mais adequada, entretanto o impacto abrupto imposto pela Portaria 34 trouxe um desequilíbrio para a gestão dos Programas. No caso do Programa de Química, por exemplo, impedirá o ingresso de novos bolsistas no curso de mestrado e doutorado. A tabela a seguir apresenta alguns números que nos levaram a essas conclusões, onde constam um curso com nota 7, quatro cursos com nota 6 e seis cursos com nota 5.

WEB tab1É preciso mencionar também, que a nova portaria foi apresentada tardiamente, quando os cursos já haviam concluído o processo seletivo para o ano de 2020 e selecionado os seus candidatos à bolsa. Após a divulgação da concessão, com base nas Portarias 20 e 21 em 3 de março, muitos Programas receosos que um atraso na implantação das bolsas trouxesse prejuízo aos alunos, e já de posse da informação quanto a cota de bolsas, informaram aos candidatos que seriam agraciados para que preparassem a documentação necessária e pudessem se organizar para o início do curso, indicação que em muitos casos não pode se concretizar em razão da Portaria 34. É natural o desconforto que essa situação trás aos alunos, principalmente para aqueles que tenham se desligado de compromissos assumidos para cursar a pós-graduação, bem como para os que não têm condição financeira para realizar o curso sem a bolsa. A Pró-reitoria teve relatos dramáticos de alunos em tal situação.
Um ponto positivo das Portarias 20 e 21 pode ser ressaltado pela análise da concessão de bolsas de doutorado à UFRJ. A tabela a seguir apresenta o número de bolsas de doutorado concedidas em função da nota na avaliação da CAPES. Na tabela não são considerados os cursos novos, com conceito A, e os cursos de doutorado com nota 3 estão incluídos apenas para completude. No final de 2019, cota total de bolsas de doutorado era de 1672 bolsas. A implantação da nova política de bolsas da CAPES, dada pelas Portarias 20 e 21 resultou em um aumento total de 82 novas bolsas, quando a cota total atingiu 1754 bolsas. Pode ser observado um aumento tímido no número de bolsas nos cursos com nota 4 e 5 (sete bolsas para cursos com nota 4 e quatro bolsas para cursos com nota 5), mas os cursos com nota 6 e 7 tiveram um aumento considerável de bolsas, 65 e 27, respectivamente. Por outro lado, a aplicação dos limites definidos pela Portaria 34 resultou em um aumento total de apenas 2 bolsas de doutorado, porém os cursos com notas 4 e 5 perderam 26 e 39 bolsas, respectivamente, enquanto os cursos com nota 6 ganharam 24 bolsas e os com nota 7 ganharam 43 bolsas. Fica claro que, na UFRJ, a Portaria 34 implicou em uma transferência das cotas de bolsas de doutorado dos cursos com nota 4 e 5 para os cursos com nota 6 e 7. Isso mostra, mais uma vez, o pouco comedimento da adoção da nova portaria.


WEB tab2Pelos pontos apresentados, se observa que a nova portaria criou um conjunto de dificuldades para as quais uma solução razoável e possível é a sua alteração ou revogação, como forma de reduzir os impactos negativos para os diversos Programas de Pós-graduação. Por essa razão, peço, respeitosamente, que a CAPES revise as decisões que nortearam a publicação da Portaria 34 e reverta seus efeitos, de forma a se ter uma aplicação paulatina dessas políticas como vinha sendo indicada pelas portarias anteriores.
Finalmente, gostaria de mencionar a interrupção da concessão de cotas para a Pró-reitoria. O retorno da referida cota poderia ser muito útil nesse momento, pois seria mais um recurso para corrigir as pontuais dificuldades que surgem da adoção da nova política de alocação de vagas e suavizar o período de transição, de modo a tentar evitar que Programas em recuperação ou cuja aplicação dos novos critérios tenha criado distorções sejam prejudicados em suas atuações.

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