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Lucas Abreu
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No último dia 5, o governo federal publicou o decreto nº 10.620/2021, que passa para o INSS a gestão das aposentadorias e pensões de servidores de autarquias, institutos e fundações federais, o que inclui as universidades, afetando professores e servidores. Isoladamente, a medida é meramente administrativa, porque não altera o regime previdenciário dos servidores e regulamenta uma mudança que foi aprovada na reforma da Previdência de 2019. Mas, no contexto do governo Bolsonaro e sua “granada no bolso” do funcionalismo, a mudança, associada às propostas da PEC Emergencial e da reforma administrativa, que tramitam no Congresso, abre o caminho para a destruição do Serviço Público brasileiro. Essa é a avaliação de especialistas da área e dirigentes sindicais ouvidos pelo Jornal da AdUFRJ.

Para a professora aposentada da UFRJ Maria Lúcia Werneck, o decreto muda só a gestão das aposentadorias, mas o ataque do governo vai vir mesmo com a reforma administrativa e a PEC emergencial. “Acho que esse decreto é uma prévia do que será a reforma administrativa”. Especialista em Previdência Social e ex-presidente da AdUFRJ, Maria Lúcia explicou que a mudança vai afetar as carreiras do funcionalismo público. “Eu não vou mais ser uma professora aposentada, mas apenas uma aposentada. Isso tem implicações de curto prazo para carreiras que têm paridade, ou seja, aumentos para inativos que acompanham os aumentos do pessoal da ativa”.
Maria Lúcia ainda chama atenção para uma consequência de longo prazo do conjunto de medidas, que é o fim das carreiras dentro do funcionalismo público. “É uma conquista importante que vai acabar. São os funcionários públicos que fazem a máquina do Estado andar, que prestam serviços públicos de Saúde, Educação, Assistência Social, tarefas importantes para o funcionamento da sociedade”, explicou a professora, que definiu o decreto como uma das ações que vão desgastando a estrutura do funcionalismo.

DESMONTE DO ESTADO
Para a professora Denise Gentil, do Instituto de Economia da UFRJ, o decreto é uma medida administrativa que pretende extinguir o sistema de previdência dos servidores, e os aposentados serão indiretamente afetados. “Eu enxergo esse decreto como uma transição para o regime único de Previdência. Quando houver a união dos dois regimes previdenciários, o déficit vai ser enorme”, explicou a professora, chamando atenção para os efeitos do desemprego e da reforma trabalhista na queda da arrecadação do INSS. “Se você junta os dois regimes e procura um equilíbrio fiscal, esse equilíbrio vai atingir os que já estão aposentados, porque vai permitir cobrar alíquotas extraordinárias”.

Segundo a professora, o decreto tem que ser analisado em conjunto com o que o governo propõe na reforma administrativa e na PEC emergencial, e que em conjunto as medidas propõem um desmonte do Estado e um ataque aos servidores. “Esse decreto desvincula todos os servidores aposentados e pensionistas dos seus órgãos de origem. E também divide os servidores do Executivo”, disse a professora. A divisão foi determinada pelo decreto, que passou a gestão das aposentadorias dos servidores da administração direta para o Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal (Sipec), e não para o INSS, como os funcionários de autarquias, fundações e institutos. “Isso vai provocar uma cisão dentro do funcionalismo público, para não criar resistência em outros setores do funcionalismo”, criticou Denise.  

“O decreto é uma consequência da derrota que sofremos com a reforma da Previdência, e muita gente na época não se deu conta da extensão do prejuízo que ela nos traria”, apontou Eleonora Ziller, presidente da AdUFRJ. Segundo Eleonora, a principal tese que sustenta o questionamento legal das mudanças é que a regulamentação deveria ser feita através de uma nova legislação, discutida no Congresso Nacional, e não por um ato de vontade do presidente da República. “Estamos diante de um procedimento que, em certa medida, pode ser considerado constitucional e previsível, mas que é de uma perversidade enorme, inclusive porque não há em andamento nenhuma proposta de reestruturação e fortalecimento do INSS, tão sobrecarregado. Nunca foi tão evidente que o governo planeja jogar muitas granadas nos nossos bolsos”, criticou. O INSS deve receber pelo menos 1,2 milhão de aposentados vindos do funcionalismo público, e já vem passando por um processo de precarização nos últimos anos.

Já a Confederação dos Trabalhadores do Serviço Público Federal (CONDSEF) considera o decreto ilegal e inconstitucional, e se junta aos demais críticos ao considerar o ato um primeiro passo para o desmonte da Previdência do funcionalismo público. “O decreto é ilegal porque as pessoas que estão sob a lei do funcionalismo público, independentemente de estar na administração direta ou em autarquias e fundações, têm que ser regidas pelo regime próprio”, explicou Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da CONDSEF. Segundo o dirigente sindical, não há respaldo legal para o governo fazer essas mudanças, mesmo que elas fossem previstas pela reforma da Previdência, por um decreto. “Para fazer essas mudanças é preciso passar pelo Congresso, ela não pode ser feita de maneira monocrática como o governo quer fazer. Há uma maneira legal para fazer isso, que é via Congresso Nacional”, criticou Sérgio. A CONDSEF pretende entrar com uma ação na Justiça para enfrentar a decisão.

MAIS GENTE NA FILA
O decreto pode ter efeitos imediatos no funcionamento do INSS. Uma nota oficial publicada pela Federação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social (FENASPS) também criticou a decisão por sobrecarregar o INSS. “A atual realidade do INSS, por sua vez, é de uma autarquia que vem sendo deliberadamente sucateada”, diz o texto, que fala que, nos últimos dez anos, o número de funcionários da autarquia caiu de 38.529 para 23.661, e apenas 68 novos servidores foram contratados desde 2018. “Desse descalabro administrativo – deliberadamente criado, mantido e incentivado pelo governo federal –, resulta o absurdo quadro atual, em que os trabalhadores que necessitam da Previdência Social precisam esperar meses, senão anos, pela concessão dos esperados benefícios de aposentadoria ou auxílio-doença”, diz a nota.

O decreto tem efeito imediato, mas segundo a pró-reitoria de Pessoal da UFRJ, “ainda há a necessidade do estabelecimento de cronograma e regras para a transição para a absorção por parte do INSS das aposentadorias e pensões dos servidores da UFRJ” e a transferência só vai acontecer após a execução de todas as pendências relacionadas a cadastro e pagamento. “A PR-4/UFRJ ainda não tem ciência se a transferência será feita em bloco após a resolução de todas as pendências, ou individualmente, conforme forem sendo resolvidas. Segundo o decreto, ainda há a necessidade de alguns atos suplementa
res para a execução desta centralização”, informou a pró-reitoria.

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