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WhatsApp Image 2020 11 20 at 12.59.27Diretoria da AdUFRJ

Os estragos provocados pela pandemia de covid-19 vão deixar marcas indeléveis na vida de cada um de nós e na sociedade como um todo. Perdas imensas, transformações profundas e uma sensação de que jamais poderemos voltar ao que existia. O novo coronavírus trouxe consigo uma espécie de lente de aumento para todas as nossas mazelas e iniquidades que, jogadas para baixo do tapete por tanto tempo, cobraram seu quinhão na hora de contabilizarmos perdas e danos. Difícil disfarçar a impiedade dos fatos.
O vírus não reconhece classe, cor ou idade, mas os seus efeitos, sim. Em diversos estudos aparecem os estragos maiores em regiões onde a renda é menor, onde há maior pobreza e menos aparatos de proteção às pessoas. São mais frágeis aqueles que vivem em situação de vulnerabilidade, sem acesso ao saneamento básico e água potável. Também nas escolas fechadas, a desigualdade deixa suas marcas, excluindo do precário ensino remoto aqueles que não possuem acesso à internet, nem condições de construir um ambiente propício ao estudo em suas moradias. Também estão muito mais expostos aqueles que dependem de transporte público, que não têm como opção o teletrabalho.
Mas nenhum desses dados é tão revelador quanto a indicação de que é a população negra quem mais sofre, pois é ela que está mais exposta a todos esses fatores. Ainda nos primeiros meses da pandemia, estudos já demonstravam que a população negra brasileira era a mais afetada, sendo que em São Paulo o risco de morrer de covid-19 é 62% maior para ela. Nos balanços das autoridades sanitárias, a taxa de mortalidade do coronavírus estava em 15,6/100.000 habitantes entre negros, e 9,6 entre os brancos. A proporção entre internações e óbitos é ainda mais reveladora: embora o número de pessoas negras internadas seja menor, o número de óbitos é maior. Menos acesso aos hospitais, saúde mais frágil porque também muitas vezes carregam comorbidades não conhecidas ou tratadas.
Não há novidade nesse quadro num país que ainda não conseguiu superar seu passado escravocrata. A novidade é outra, e é dela que queremos falar nesse 20 de novembro de 2020. A escolha do título de Doutora Honoris Causa para Carolina de Jesus na UFRJ revela que alguma coisa também vem mudando no país. Fruto de uma luta incansável dos movimentos negros, de muitas gerações que construíram uma consciência negra no país, que formaram seus intelectuais e escreveram seus nomes na conquista de políticas públicas compensatórias, em ações afirmativas, e na paulatina construção por representatividade em todos os espaços sociais. Não é exagero afirmar que finalmente as prateleiras de nossas livrarias estão mais negras, como estão mais negras nossas salas de aula. É dessa enorme força que está nascendo um novo país, que muitos teimam em sufocar e fazer definhar. Desde o assassinato de Marielle Franco estamos em uma guerra declarada. Uma guerra que sempre existiu, que matou todos os anos milhares de jovens sem nome e sem futuro, mas que em março de 2016 foi escancarada numa ousadia que não acreditávamos que pudesse ocorrer: executaram uma vereadora em pleno centro da cidade, sob olhos de todos. Há algo de muito podre num país onde isso acontece, onde alguém que exalta um torturador é eleito. Mas as eleições da semana passada demonstraram que Marielle de fato foi semente. As candidaturas de mulheres negras em todo o país cresceram, frutificaram em luta e mais espaço.
Ainda está difícil respirar, mas eles passarão e nós...
Já estávamos fechando esta edição quando recebemos a notícia que pela primeira vez estava sendo organizado na UFRJ um encontro de docentes negros e negras. Repassamos a notícia, cobrimos o evento e é ele que encerra este jornal. Esperamos que seja também o início de um novo tempo para esta que foi uma das últimas universidades do país a aderir ao sistema de cotas. Agradecemos ao professor Vantuil pela organização do evento, do qual participamos com uma saudação e a garantia de que as portas da AdUFRJ estarão sempre abertas e à disposição. Que venham outros encontros, que a memória de Zumbi dos Palmares seja sempre lembrada, e que o Dia da Consciência Negra seja todos os dias, todas as horas, em todas as salas de aula, em todos os laboratórios.

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