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WEBABRE1134aBastaram 26 horas para o Jornal da AdUFRJ, antes de qualquer outro veículo de imprensa, descobrir uma mentira e uma omissão no currículo do novo ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli, Às 15h31 da quinta-feira, 25, o presidente Jair Bolsonaro anunciou a nomeação em seu perfil no Twitter e informou que o novo titular do MEC seria “doutor pela Universidade de Rosário”, da Argentina. Às 17h59 da sexta, 26, o reitor da instituição, Franco Bartolacci, negou a titulação à reportagem.
De acordo com o perfil publicado pela assessoria do MEC, o novo ministro também seria oficial da reserva da Marinha. Mas Decotelli passou apenas dois anos na Escola de Formação de Oficiais para a Reserva da Marinha (EFORM). Não se trata, portanto, de um oficial de carreira que entrou para a reserva, como faz supor o texto do ministério, mas de alguém formado para a reserva em baixa patente. Como os jovens que procuram algum estabelecimento de ensino militar para substituir o serviço militar obrigatório.
No caso mais grave encontrado até agora, o economista Decotelli chegou a concluir todos os créditos do doutorado, mas teve sua tese reprovada. “Ele não teve a tese aprovada para receber o título de doutor, portanto, ele não é doutor pela UNR. Apresentou uma tese que foi avaliada negativamente pela banca constituída para esse fim”, afirmou o reitor argentino.
Questionado, o MEC se limitou a responder que o novo ministro cumpriu todos os créditos do doutorado. A assessoria chegou a encaminhar a cópia do certificado de conclusão das disciplinas do curso. Mas nada falou sobre a tese, condição essencial para a titulação.
Apesar das mentiras e omissões, Decotelli continua sendo considerado o casamento perfeito entre a ala ideológica, a ala militar e o mercado financeiro, setores que disputavam o comando da Educação. O novo número 1 do MEC tem perfil discreto, não é considerado um “olavista”, mas nem por isso foge do alinhamento com Jair Bolsonaro. Para interlocutores, o presidente afirmou que o candidato escolhido não deveria abrir mão de uma “guerra cultural” na Educação.
O novo ministro também é bastante próximo de Paulo Guedes.
Para o cientista político Josué Medeiros, diretor da AdUFRJ, a tendência é que Congresso, STF e mídia baixem o tom das críticas a Bolsonaro e que o novo ministro seja capaz de fatiar o MEC, abrindo mais espaço aos empresários do setor. “O que vai certamente tonar mais complexa a nossa luta”, diz. O compromisso de Decotelli com a “guerra cultural”, citada pelo presidente, pode vir por meio do modelo de escolas cívico-militares, acredita o professor.
O novo ministro foi presidente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) entre janeiro e agosto de 2019 e, sob sua gestão, fechou contratos controversos. Deu aval a uma licitação no valor de R$ 3 bilhões, na qual foram apontadas irregularidades pela Controladoria-Geral da União, como um número de equipamentos de informática 177 vezes superior ao necessário para suprir as escolas às quais seriam destinados. Dois dias depois do parecer, Decotelli foi exonerado do cargo e a licitação, cancelada. Também fechou contrato no valor de R$ 374 milhões com a empresa Brink Mobil, escolhida por licitação, em fevereiro de 2019, para fornecer material escolar para o ensino fundamental. Em dezembro do mesmo ano o dono da empresa acabou preso pela Polícia Federal, suspeito de praticar crimes de corrupção e fraude em licitações.
A gestão de Decotelli à frente do FNDE também foi considerada ineficiente por funcionários do órgão. Ele passou 23% do tempo em que foi presidente do fundo viajando. Com a ausência, muitos processos e documentos atrasaram ou pararam. Entre janeiro e julho de 2019, nenhuma das 22 licitações previstas para acontecer tinham saído do papel. Seriam aquisições para equipamentos de informática, bibliotecas, materiais didáticos e até para ônibus escolares, para dar alguns exemplos.
A presidente da AdUFRJ, professora Eleonora Ziller, também vê o anúncio com preocupação. Para a dirigente, o novo ministro amarra o acordo político feito com o centrão. “O FNDE tem muito dinheiro, mais de R$ 50 bilhões. O centrão adentra na educação com tudo, se apodera do grande fundo, toma conta da chave do cofre em troca da estabilidade no Congresso”, acredita.
As entidades estudantis lançaram nota assim que o nome de Decotelli foi anunciado. Afirmam que o novo ministro não tem experiência na educação, mas sim na área financeira e militar “o que é sempre motivo de preocupação”, diz trecho do documento assinado pelas associações nacionais dos estudantes secundaristas, universitários e pós-graduandos (UBES, UNE e ANPG).
Flávia Calé, presidente da ANPG, considera uma importante vitória que os olavistas tenham sido deslocados do posto mais alto do MEC. Mas vê com cautela a indicação. “O fato de ser ligado a setores financeiros e não ter trajetória na educação acende um sinal de alerta. Não podemos deixar que MEC saia da paralisia para o desmonte do seu caráter público”, afirma.

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