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vac economia 140120117a76395565Professores criticam política econômica do ministro Paulo Guedes - Foto: Valter Campanato/Agência BrasilUma colcha de retalhos pode ser uma boa imagem para ilustrar o que o governo Bolsonaro propõe em termos de política econômica diante da pandemia do coronavírus. Para docentes de diferentes matizes teóricas do Instituto de Economia, as medidas anunciadas ao longo dos últimos dias são tímidas, lentas e limitadas por princípios ideológicos. A nova realidade coloca em xeque a política ultraliberal que entronou o ministro Paulo Guedes. E o governo não tem um plano B.
O Professor Adjunto Carlos Pinkusfeld separa as iniciativas em três blocos heterogêneos: crédito, transferência de renda e recurso para produção emergencial para atender à saúde. O primeiro grupo não apresenta gastos propriamente ditos. Mas toca em pontos-chave para o momento. “É importantíssima a rolagem da dívida dos estados e municípios. Estes estarão na linha de frente do combate à pandemia e não faria sentido estar enviando parte da receita para o governo federal em vez de gastá-la com emergências médias, como pagamentos de salários”, argumenta o economista.
A ação do Banco Central, liberando um volume de R$ 200 bilhões de depósitos compulsórios para aumentar a liquidez do sistema financeiro e baratear o crédito, foi  considerada um ponto positivo pelos economistas. “É crucial manter as empresas do sistema financeiro, e não financeiro, com um mínimo de liquidez e possibilidade de sobrevivência, evitando-se o colapso total da economia”, destaca Pinkusfeld.
Contudo, apenas na sexta-feira (27) o governo confirmou a articulação da iniciativa com uma política de proteção de emprego, anunciando R$ 40 bilhões em crédito para amparo das pequenas e médias empresas que se comprometerem com a manutenção dos postos de trabalho. A professora Associada Marta Castilho avaliou a iniciativa, com validade programada para os dois próximos meses: “Não faria sentido a ajuda se as empresas embolsassem o dinheiro ou investissem em uma modernização tecnológica para demissão de funcionários”.
As sinalizações da equipe econômica do governo para o mundo do trabalho são criticadas pelo  economista Eduardo Crespo, professor de Economia Política  do Instituto de Relações Internacionais e Defesa (IRID). Ele e o colega Maurício Metri assinam duras críticas à Medida Provisória 927, que, entre outras medidas, possibilitava a interrupção de pagamentos de salários por quatro meses em função da calamidade pública. Publicada em 22 de março, a MP foi revogada após reação da opinião pública.
“Essa MP seria uma bomba já no curto prazo. O Brasil é um país muito violento. A convulsão social é uma questão grave”, opina Crespo. E reforça que “com o mundo se fechando às exportações, não é hora de reduzir salários ou postos de trabalho”. “Haverá uma queda brutal da demanda agregada. A combinação de uma eventual suspensão de contrato ou corte de salários com esse choque negativo seria um precipício”, justifica.
 A mesma lógica guia a opinião dos especialistas em relação ao funcionalismo. “A proposta de corte dos servidores é uma insensatez. Ninguém no mundo está propondo isso. É contraproducente”, diz Eduardo Figueiredo Bastian, professor Adjunto do IE.
Ainda sem desenho palpável, a ideia discutida por parlamentares e  executivo é desconstruída pelos economistas.  “Em termos de volume, seria insuficiente para as necessidades financeiras do combate ao coronavírus. Em termos econômicos, não agrega, pois não injeta dinheiro novo. E, em termos práticos para justiça social, a taxação de 0,1% das rendas mais altas do Brasil, teria um fôlego maior”, aponta Marta Castilho. “Aparentemente, o governo está aproveitando a crise para fazer passar medidas que não têm a ver com o esforço para aquecer a economia”.
Em um volume bem mais modesto, aparece o segundo grupo de medidas citado pelo economista Carlos Pinkusfeld, como aumento de gastos com as transferências de renda para as famílias mais pobres. Sob pressão do coronavírus, a Câmara dos Deputados aprovou, na noite da quinta-feira (26), uma renda emergencial no valor de R$ 600 por adulto de baixa renda enquanto durar a crise da Covid-19. Mães solteiras receberão R$ 1,2 mil. O Senado confirmou as medidas, no dia 30.
A economista Marta Castilho ressalta que proteger os mais vulneráveis, como informais, autônomos, desempregados e os que dependem do programa Bolsa Família “é uma questão de humanidade. Mas também faz parte do jogo para manter a economia rodando”.  
A terceira e última linha de ação destrinchada por Pinkusfeld é considerada “fundamental” e também “muito pouco explorada” pelo governo brasileiro.  Ela corresponde aos ajustes necessários para que o aumento das demandas relacionadas à saúde possa ser atendido pelo equipamento industrial.  Eduardo Crespo toca na mesma ferida com o recente exemplo estadunidense: “Donald Trump já colocou a General Motors na linha de produção de respiradores para atender à saúde”.
“Desenvolvidos ou subdesenvolvidos, de governos de direita ou de esquerda, em todos os países, o foco é evitar mortes. A projeção é de centenas de milhares de óbitos, se não chegarmos a um milhão. Nesse sentido, o que acontece no Brasil hoje é uma loucura”, completa o professor Crespo, do IRID.
 Para os economistas, existe um consenso crescente no mundo de que é hora de gastar. Mas o Brasil se move mais lentamente nessa direção. “O gasto público, no momento, tem virtude. Especialmente o gasto com saúde. O governo precisa colocar na conta o efeito devastador da pandemia sobre a mão de obra. Levar em consideração como esses trabalhadores retornarão para a produção depois da quarentena”, analisa Martha Castilho.

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